Nossas parcas comunicações com o sul/sudeste eram os aviões cargueiros, os Búfalos e Hércules da Força Aérea Brasileira/FAB e as transmissões saudosas da Rádio Globo, Rádio Nacional, Rio-Mar e Difusora do Amazonas, as quais nos faziam “ver” os produtos oferecidos nos comerciais (Fanta – Tão saborosa que dá gosto ter sede ou do Grapette, quem bebe, repete) e os jogos no Maracanã.
No inverno amazônico, tínhamos a presença dos navios de grande calado nos trazendo mantimentos, como o “Leopoldo Peres”, “Lobo D’Almada” e “Augusto Montenegro” dentre outros, o que minguava com a chegada do verão.
Mas quando as águas subiam e voltavam aqueles “cisnes brancos” ao nosso caudaloso Rio Madeira, era maravilhoso visitá-los no porto e saborear a Coca-Cola tão falada. Isso aos 9, 10 anos. Saborear uma maçã, que só víamos nos filmes. O Grapette então, era o néctar dos deuses.
Porém, Porto Velho era linda. Fisicamente, éramos uma província na verdadeira acepção da palavra. A cidade acabava alí próximo à Igreja de São Cristóvão e se dividia quase que por classe social ou por afinidade, mas nada compulsório.
O centro era o comércio, onde portugueses, árabes, judeus, ingleses e tantos outros abriram seus pontos comerciais, cinemas, restaurantes, etc.; na Arigolândia se fixaram os “arigós”, soldados da borracha; na Favela residiam os carroceiros, com sua Escola (Escola Monteiro Lobato) que, à noite se transformava na sede do Sindicato e, aos fins de semana, na sede do Forró dos Carroceiros.
A Olaria era o reduto dos oleiros que trabalhavam na Fábrica de Tijolos do então Território; o Areal era só um caminho descendo alí entre o Pompílio e a Sérgio Marques onde hoje é o Colégio Dom Bosco. A Campos Sales rumo à Alexandre Guimarães era realmente só um caminho.
No Triângulo e Alto do Bode residiam o pessoal da mão-de-obra da Estrada de Ferro Madeira Mamoré, na sua grande maioria barbadianos, não todos, pois também vieram algumas famílias de Açores, Granada e de outras pequenas ilhas do Caribe. Apenas a arregimentação foi em Barbados, o que nos levou a caracterizá-los, todos, como barbadianos, esses senhores de pele escura e de um coração vermelho, forte e temente a Deus, que vieram nos cobrir de orgulho e fincar de uma vez por todas, a despeito do tal progresso, a nossa raiz, a nossa cultura e o nosso caráter nesta terra abençoada.
No Caiari, o nosso primeiro conjunto habitacional, ficaram os que compunham o “staff”, o Estado Maior da Estrada de Ferro, seus engenheiros, administradores, técnicos, etc., e, no Mocambo, os mascates. Vende-se tinta, troca-se batéia, compra-se tecido, bate-se um tambor à uma entidade, toca-se violão e por aí afora. Era uma comunidade sadia, trabalhadora mas, essencialmente boêmia.
Antônio do Violão, Capote, Chicorote, Borba, Guedes, Zé Paca, Euro Lago, Manoel Magno de Arsolino, Piriquitinho, Esmite Bento de Melo, Waldir, D. Adélia, Lucimar, Tucandeira, Mugrabi, Cabeça, Valcir, Alemão, Jayme, Manelito, Amiraldo, Arlindo e tantos outros.
Aí veio esse negócio de droga. Isso não tem muito tempo, não, um pouco mais de vinte e cinco anos, o que quer dizer um pouco mais que uma geração. Ainda bem que hoje arrefeceu. Menos mal. Outros bairros de uma gente decente e trabalhadora eram a Baixa da União e Morro do Querosene. Alí onde hoje é o Posto São Paulo, um pouco mais para o sul e adjacências, se erguia o Morro do Querosene.