Em meio a uma grande operação policial que expõe suas entranhas, o PCC faz campanha para angariar sócios, muda a estrutura de comando e lança ofensiva para dominar o crime no Brasil e avançar no exterior
Foto: ISTOÉ
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O Primeiro Comando da Capital (PCC), a mais poderosa e ameaçadora das facções criminosas do país, completa 25 anos de existência e está passando por um momento de ajustes e de expansão. Mudanças na estrutura de funcionamento depois da morte de alguns de seus líderes parecem ter deixado a organização mais ágil. Uma campanha nacional para ganhar novos adeptos, com desconto na taxa de adesão, tem metas de fazer a organização crescer 3% ao mês, o equivalente a mil novos comparsas. Debaixo dos olhos do Poder Público e com o quartel general instalado na Penitenciária 2, de Presidente Venceslau, em São Paulo, onde está seu principal líder, Marcos William Camacho, o Marcola, a facção alastra o terror e deixa no caminho um rastro de sangue. Seus tentáculos já alcançam presídios de todos os estados brasileiros e envolvem criminosos de outros países da América do Sul e até da Europa.
A estratégia de desenvolvimento do PCC veio a público, nestes dias, por meio do inquérito da Operação Echelon, que interceptou telefonemas e investigou cartas trocadas entre comandantes da facção, recuperadas no esgoto da Penitenciária 2. Como resultado, a investigação da Polícia Civil e do Ministério Público levou ao indiciamento de 75 membros da organização e revelou que o PCC tem cerca de 30 mil integrantes “batizados” em todo o País, que juram lealdade aos princípios do grupo. Revelou, também, de maneira pormenorizada a sua estrutura de comando. Sabia-se que ele contava com um núcleo central chamado de Sintonia Geral. Descobriu-se que a esse núcleo está subordinada a Sintonia Final dos Estados e Países, nova liderança no segundo escalão, que dirige a expansão nacional e internacional da facção, e outras várias sintonias ou gerências especializadas, como a de cadastro, do livro negro e as de cada estado.
O inquérito de 500 páginas, assinado pelo promotor Lincoln Gakiya, do núcleo de Presidente Prudente do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), traça um desenho atual do PCC. Mostra, por exemplo, que a facção recruta pessoas com próteses no corpo para entrar com celulares nos presídios e que ela tem vários agentes penitenciários nos seus quadros, como o chefe de segurança de uma prisão em Londrina, no Paraná. Expõe também uma comunicação intensa entre seus membros para discutir negócios, assassinatos e ataques a fóruns pelo País para roubar armas — e revela que a facção se apoia fortemente nos meandros corruptos do sistema penitenciário para ganhar força. Conforme uma das ligações interceptadas na Operação Echelon, em que um criminoso chamado Filipe Soares, vulgo Assassino, conversa com o aliado Canela, o comando do PCC considera os presídios brasileiros lugares propícios e amigáveis para aumentar seus quadros. ”O sistema prisional é máquina de fazer PCC”, diz Assassino, que comanda a facção no estado do Espírito Santo, onde 38 presídios estão sob domínio do crime.
Irmandade secreta
“O PCC é o grupo criminoso que mais cresce no mundo atualmente”, diz o promotor Márcio Sérgio Christino, que investigou a facção e é autor do livro “Laços de Sangue — a história secreta do PCC”. “Está avançando sobre seus concorrentes e tem um amplo horizonte.” Na visão de Christino, o PCC é uma típica organização mafiosa atrás de dinheiro e poder, uma empresa do crime formada por gerentes e soldados, que já pode ser considerado um cartel internacional das drogas. Outro livro que acaba de ser lançado, “Irmãos — uma história do PCC”, do sociólogo Gabriel Feltran, mostra a facção como uma irmandade secreta, no estilo da maçonaria. “As sintonias passam a ser o modo de organizar a facção, e cada uma delas age com total autonomia em relação às outras. O modelo de sociedade secreta é fortalecido, incorporando as estruturas empresariais e militares”, diz o autor. Com a campanha para atrair novos comparsas, chamada de “adote um irmão”, o PCC quer conquistar 30 novos integrantes por dia. Para tornar a adesão mais atraente, a organização aboliu a contribuição mensal, chamada de “cebola”, de R$ 900. Nos últimos tempos, várias mortes impuseram uma mudança na estrutura de poder do PCC. Em dezembro, foi morto a golpes de estilete uma de suas principais lideranças nacionais, o traficante Edilson Borges Nogueira, o Birosca, no presídio de Presidente Venceslau. Em fevereiro, caíram outros dois membros da Sintonia Geral, Rogério Jeremias, o Gegê do Mangue, e Fabiano Alves, o Paca, brutalmente assassinados em Aquiraz, no Ceará. Estes dois crimes teriam sido encomendados por Marcola. Na semana passada, um dos principais ladrões de banco e financiador da facção, Cláudio Roberto Ferreira, o Galo, 38, foi morto em São Paulo. O Audi Q3 blindado que dirigia foi atingido por 70 tiros.
Projeto eleitoral
Em parte, a movimentação no PCC, que também se classifica como “partido”, pode estar associada às próximas eleições. Ao mesmo tempo em que busca adesões entre os detentos, a facção quer também ter maior presença institucional fora das cadeias. O PCC tem patrocinado eventos em igrejas na periferia de São Paulo e trata de se infiltrar na política para fechar acordos que diminuam a repressão contra o crime em suas áreas de atuação. A facção vem fazendo candidatos desde a última eleição. O nome mais evidente é o do prefeito eleito de Embu das Artes, município da Grande São Paulo, Ney Santos (PRB), acusado pelo Ministério Público de envolvimento com o crime e de participar de um esquema que envolvia postos de combustíveis para lavagem de dinheiro do tráfico. Santos teve o mandato cassado, mas se mantém no cargo por uma liminar.
Segundo o jurista Wálter Maierovitch, estudioso do crime organizado, o PCC conta hoje com domínio territorial, social e consegue promover a difusão do medo. “Com isso, em tese, ele pode ter controle eleitoral e comprometer o sistema democrático”, diz. “A facção enriqueceu e a economia que movimenta nunca foi efetivamente atacada”. Segundo a polícia, o PCC fatura entre R$ 400 milhões e R$ 800 milhões por ano. Tem capacidade de sobra para investir em candidatos.
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