O objetivo dos seminários do mestrado, de sempre trazer representantes que possam contribuir no âmbito dos Direitos Humanos e da Justiça.
Foto: Comunicação - TJRO
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Na tarde da última quarta-feira (13), o seminário acadêmico “Direitos Humanos e populações tradicionais, periféricas e pauperizadas nos contextos das novas ordens globalizadas”, promovido pelo mestrado profissional interdisciplinar em Direitos Humanos e Desenvolvimento da Justiça (DHJUS), levou ao auditório do Tribunal de Justiça de Rondônia discussões avançadas sobre os impactos das usinas hidrelétricas (UHEs) instaladas no rio Madeira, especialmente sobre a pauperização das populações tradicionais e ribeirinhas. O evento, realizado em parceria entre a Escola da Magistratura do Estado de Rondônia (Emeron) e a Universidade Federal de Rondônia (Unir), contou com a participação do cientista norte-americano Philip, e do educador popular Iremar Ferreira.
Na abertura do seminário, a diretora do Departamento Pedagógico, Ilma Ferreira, que representou a direção da Emeron, destacou a parceria com a Unir no mestrado, que segundo ela “tem dado muito certo, apresentado resultados e engrandecido a Escola, a comunidade acadêmica e todos que fazem parte do projeto”. O vice-coordenador do DHJUS, Dr. Márcio Secco, sublinhou o objetivo dos seminários do mestrado, de sempre trazer representantes que possam contribuir no âmbito dos Direitos Humanos e da Justiça.
Tomada de decisão
Intitulada “As Hidrelétricas do Rio Madeira: Impactos e tomada de decisão”, a palestra do Dr. Philip Fearnside, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), que desde a década de 1970 estuda diferentes modos de desenvolvimento na Amazônia brasileira e os problemas ambientais decorrentes do seu desmatamento, trouxe dados e questões atuais sobre a situação energética do país. Ao assinalar que a maior parte da eletricidade é usada para as indústrias, ele questiona se esse é um bom caminho para o desenvolvimento da região, tendo em vista que as populações ribeirinhas são as maiores vítimas e não são financeiramente beneficiadas, e o Brasil tem várias outras opções de energia, como solar e eólica.
Segundo as previsões até 2040, o cenário é de diminuição acentuada das chuvas, especialmente no Nordeste, mas atingindo também o Norte, o que causará uma perda de geração de energia pelas hidrelétricas. Ainda assim, está prevista a instalação de novas usinas transnacionais no rio Madeira. “Não se considera as mudanças climáticas, se presume que o que foi medido no passado vai se manter”, alerta.
Por fim, falou sobre as mudanças no rio que provocaram a perda de sustento da população pesqueira, como o aumento na força da água após as UHEs (que também impedem a subida de peixes), a erosão e o desalojamento como consequência das enchentes, potencializadas pela elevação da água causada pelo acúmulo de sedimentos gerado pelas usinas. Há ainda o problema do mercúrio, ocasionado pelo garimpo na região desde os anos 1980, e do gás metano produzido pelas usinas e que impacta no aquecimento global, segundo o IPCC, e a previsão de que os povos indígenas e ribeirinhos acabarão expulsos da maior parte da Amazônia brasileira.
“O mais fundamental é sobre a tomada de decisão, não é só tentar consertar os problemas depois das barragens serem construídas, tem que haver decisões melhores no início, se deve ou não fazer a barragem”, diz o cientista. “Precisa considerar todos os tipos de impactos que não estão entrando no planejamento, os planos não levam em consideração absolutamente nada de mudança climática, então é muito importante que tudo seja incorporado no sistema de tomada de decisão, pois isso vai tirando a lição que a sociedade pode aprender sobre essas obras”.
Mediado pelo Dr. Marco Teixeira, coordenador do seminário e professor do DHJUS, o debate após a palestra reuniu os professores da Unir Fernando Novoa e Artur Moret, o representante do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), João Dutra, e o pescador Valdinei Severiano, viúvo da ativista Nicinha Magalhães, assassinada em 2016. Ele fez um apelo pela comunidade do distrito de Abunã: “Antes das usinas tinha emprego na comunidade, hoje acabou toda a renda”. E questionou: “A única profissão que sobrou no Abunã é o garimpo, isso é progresso?”.
Disputa Territorial
Em seguida, Iremar Ferreira ministrou a palestra “Rio Madeira: Território em disputa”, na qual abordou historicamente a resistência dos povos da região contra a tomada de seus territórios, sempre feitas sob o discurso do progresso ou em nome do “bem da nação”. Entre as ações da ofensiva capitalista que viola direitos na Amazônia brasileira, citou as parcerias público-privadas e obras do PAC, não-cumprimento no marco legal e aumento da insegurança dos moradores.
Iremar destacou a relação das pessoas baseada na troca (entre elas e com a natureza), que passou para uma economia de mercado, baseada no lucro e competitividade, gerando empobrecimento. Para exemplificar o empobrecimento dos povos, apresentou depoimentos de moradores da região do Baixo Madeira, que narraram suas relações com a beira do rio e sua subsistência antes e pós-usinas. A maioria vivia da pesca e da agricultura, duas modalidades intensamente prejudicadas com as alterações do leito do rio e também com a mudança na rotina da água, provocada pela abertura das comportas. Ao final, defendeu o reconhecimento do direito humano das águas dos rios.
O educador elogiou a iniciativa do seminário: “É de suma importância essa parceria da Emeron com a universidade nesse processo de formar formadores de opinião, que estão preocupados com o momento que vivemos e em pensar em saídas ou caminhos que ainda teremos que vivenciar”. Sobre a perspectiva de futuro, conclui: “Precisamos tomar consciência do que representa todo esse processo de violações de direitos e impactos, e que podemos olhar para a frente. É preciso pensar em saídas para atender nossas populações e também contribuir com a matriz nacional, para o chamado desenvolvimento que tanto se quer pro país, mas garantindo os direitos das populações para que continuem onde vivem. Não dá para ficar à mercê de uma lógica única, mercantilista, que transforma os nossos recursos naturais em mercadorias a partir da geração de energia, como é o caso daqui das hidrelétricas”.
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