HISTÓRIA: Porto Velho comemorará 110 anos da Estrada de Ferro Madeira Mamoré, fechada?

Desde 2010, o complexo histórico está em obras e reformas tirando uma opção de lazer para a população

HISTÓRIA: Porto Velho comemorará 110 anos da Estrada de Ferro Madeira Mamoré, fechada?

Foto: Desde 2010, Estrada de Ferro Madeira Mamoré vive sucessivos "abre-fecha" - Foto: Rodrigo Moraes/TV Caboquinho

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Segundo levantamentos feitos pelo Rondoniaovivo, há pelo menos 12 anos a Estrada de Ferro Madeira Mamoré (EFMM) está sendo fechada e reaberta ao público, devido a sucessivas obras e reformas que parecem nunca terem fim.
 
De forma oficial, ainda na gestão Roberto Sobrinho (PT), em 2010, foram gastos 12 milhões de reais. Já em 2019, sob a administração Hildon Chaves (PSDB), foram mais R$ 20 milhões, fruto de compensações sociais da Hidrelétrica de Santo Antônio.
 
Mas, segundo o ativista e pesquisador do complexo histórico, Anderson Leno, foram direcionados R$ 18 milhões em 2010 e outros 30 milhões de reais gastos nos últimos três anos, na administração do PSDB.
 
 O ativista e pesquisador Anderson Leno lamenta que o complexo histórico fique tanto tempo fechado - Foto: Arquivo Pessoal
 
“Houve contrapartida da prefeitura de R$ 7 milhões nessa última obra. Até pouco tempo atrás, ainda tinha a placa do Roberto Sobrinho e lá apareciam esses 18 milhões, também de compensações sociais. Fizeram basicamente o que estão fazendo hoje: pintaram tudo, deram um grau, apararam o mato. Tem um calçamento que já está quebrando e se desgastando. Tem o entrocamento, mas é muito recurso para pouco serviço efetivo”, lamentou o ativista.
 
E segue: “Como cidadão a gente se sente lesado por ver tanto recurso entrando na Madeira Mamoré e pouco sendo efeito, nada das locomotivas. Desde 2010 não se vê uma locomotiva andando ali naquele trecho de Porto Velho a Santo Antônio. Desde o primeiro mandato do atual prefeito que ele prometeu que os trens iriam voltar e nada. São quase R$ 50 milhões e praticamente nada foi feito. O Iphan diz que gastaram muito com levantamento técnico. Eu não acredito nisso”.
 
Em muitas andanças, Anderson encontrou várias peças da EFMM sendo destruídas pelo tempo - Foto: Arquivo Pessoal
 
 
Anderson Leno também elege seus culpados por tanto tempo a história estar cercada por tapumes, montes de terra e máquinas que parecem nunca terminar o trabalho.
 
“Muita burocracia e tem muitos culpados: parte da prefeitura, parte do Legislativo. Eles fazem uma coisa tão amarrada que não tem como a população se envolver. São 12 anos para mim que vão virar 20. A Madeira Mamoré é um palanque para muita gente arrecadar e ganhar dinheiro público. E muita gente não faz. É triste ver que vamos chegar a 110 anos com o complexo fechado”. 
 
Segundo o ativista, muitas peças se perderam após a grande enchente de 2014; e muitas ainda estão sendo destruída pela ação de vândalos - Foto: Arquivo Pessoal
 
O ativista ferroviário também acredita que os administradores públicos vão dar um “jeitinho” para fazer uma comemoração pelo aniversário de inauguração da EFMM.
 
“Esse ano, talvez por ser período eleitoral, abra. Mas acho difícil. São 12 anos parada, vendo as locomotivas sem uso, peças sendo furtadas, cortadas, derretidas, sendo presenteadas como adorno. Ninguém faz nada. Acho que vão fazer uma queima de fogos, com bandas de axé, pagode. E um palanque com muitos políticos. Uma inauguração meia-boca para dizer que estão inaugurando antes das eleições e talvez fechem novamente”, falou Leno.
 
Fiscalização
 
O promotor de Justiça do Meio Ambiente, Urbanismo e Patrimônio Público, Jesualdo Leiva de Faria, do Ministério Público Estadual explicou ao Rondoniaovivo que o complexo da EFMM tem várias complexidades, onde há fiscalização por parte do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), com o local sendo de propriedade da Superintendência de Patrimônio da União (SPU), cedido à Prefeitura de Porto Velho.
 
“Em 2018 foi feito um acordo judicial entre o Município, Odebrecht, o Iphan e os Ministérios Públicos Estadual e Federal e ficaram estabelecidas ali algumas medidas. Entre elas, a reforma da EFMM. Só que uma parte com a Odebrecht e a outra com o Município. A parte da construtora foi terminada com um pouco de atraso, mas foi dada quitação no processo. A Prefeitura ficou com 10 ou 15% da obra e contratou uma empresa. Só que ela não cumpriu o contrato”, apontou ele.
 
E completa: “Houve rescisão e com a demora para retomada da obra, a Odebrecht assumiu esse último pedaço também. Soube que será concluída ainda neste mês e foi lançado o edital de concessão da administração. O que estamos fazendo é acompanhar e cobrar. O que também aconteceu é que os trabalhos começaram sem nenhum planejamento, sem licenças. A intervenção do MP foi para isso. Dos bombeiros, urbanística. Começaram sem licenças”.
 
Promotor Jesualdo Leiva de Faria acompanha a reforma da EFMM desde 2019 e tem feito o possível para que o processo não demore mais do que está - Foto: Divulgação/MP
 
O promotor também pontuou um dos motivos do atraso: “Assim como há a cobrança em qualquer obra particular, a prefeitura também precisa ter todas as licenças para realizar uma obra. Nossa cobrança foi nesse sentido. Houve uma demora por causa disso”.
 
O representante do MPE comentou sobre a expectativa em relação da qualidade dos trabalhos atuais em relação à outras reformas feitas anteriormente. 
 
“O processo todo tem a tendência de ter mais durabilidade. O espaço está todo cercado, estacionamento interno. Vai ter uma empresa que vai tocar o complexo. Infelizmente, o poder público não consegue fazer bem essa gestão. Eu tenho boas expectativas. Não sou de Rondônia, mas estou aqui há 36 anos e sonho com aquilo funcionando, sendo visitado”.
 
Papel
 
O vereador, professor e historiador Aleks Palitot (PTB), que representa a defesa da EFMM e todo seu acervo, também conversou com o Rondoniaovivo para apresentar o que vêm sendo feito pela “Ferrovia do Diabo”, nome famoso dado pelas milhares de mortes e pelas condições de trabalho durante a construção.
 
“O Cemitério da Candelária tem dinheiro há um ano e meio, tem projeto e já estamos até com medo de perder os recursos. E a SPU não consegue liberar autorização para a Prefeitura começar a obra. A gente sempre luta pelo complexo inteiro. Até o Iphan que é difícil já liberou, mas a SPU nada. O problema não é aqui, mas em Brasília”, diz Palitot.
 
E continua: “Tem recurso para fazer o telhado da igrejinha de Santo Antônio, que poderia ser inaugurado agora no arraial. Não vai ter. Tem recurso para trocar o telhado do Memorial Rondon e não foi feito. Tem dois anos que a locomotiva 6 foi retirada do pátio para ser reformada, com recurso de R$ 500 mil e nada. As Três Caixas D’Água mesma coisa”. 
 
Aleks Palitot e alguns dos ex-ferroviários percorrendo um pequeno trecho que ainda existe até Santo Antônio - Foto: Divulgação
 
Para ele, o papel da imprensa é importante para que o aniversário dos 110 anos da Estrada de Ferro Madeira Mamoré não passe em branco.
 
É um século, mais 10 anos. A intervenção no complexo, aliada a um momento histórico que deu origem a nossa cidade, jamais podem ser esquecidos. O hino de Porto Velho há uma estrofe: ‘Do calor das oficinas, do parque Madeira Mamoré, pela forja dos bravos pioneiros, imbuídos de coragem e fé’. A Estrada de Ferro deu origem a Porto Velho, que nasceu do calor dessas oficinas”, pontuou Palitot.
 
Defesa
 
O superintendente do Iphan em Rondônia, Augusto Silva, explicou qual o papel da instituição em todo o processo envolvendo a EFMM.
 
“Temos uma função muito parecida com os Ministérios Públicos Estadual e Federal: de fiscalização, cobrança e de preservação do patrimônio histórico. A propriedade e guarda é da SPU, já que é um patrimônio da União que está cedido há cerca de três ou quatro anos para a prefeitura. Temos acompanhado tudo de perto e acreditamos que será uma das melhores reformas que esse complexo teve”, destacou ele.
 
Augusto Silva do Iphan diz que instituição atuou como "ponte" para acelerar processos envolvendo documentos da EFMM - Foto: Divulgação
 
Ele também garante que mesmo com toda a burocracia que envolve o serviço público, o processo envolvendo a Estrada de Ferro Madeira Mamoré está em um ritmo satisfatório.
 
“Os técnicos precisam de tempo para analisar tudo e apontar quais correções precisam ser feitas para atender a legislação. Muitas vezes nós até orientamos as entidades públicas em como agilizar o processo. Nos últimos anos, estamos agindo como pontes, unindo as instituições para que possam trabalhar em conjunto e fazer com que o patrimônio público tenha a conservação devida e o cuidado necessário”, afirmou o representante do Iphan.
 
 Estrada de Ferro ainda não tem data para ser reinaugurada, mas Funcultural garante festa - Foto: Rodrigo Moraes/TV Caboquinho
 
Planos
 
O diretor de Patrimônio da Fundação Municipal de Cultura (Funcultural), Altair Santos, mais conhecido como Tatá, afirmou ao Rondoniaovivo que há conversas dentro da Prefeitura de Porto Velho para que aconteça uma festa de comemoração dos 110 anos da EFMM.
 
“Temos umas três ou quatro secretarias se movimentando para esse ato, que seja mais cultural para celebrar essa data. Durante os próximos dias, já vamos cuidar da programação. Também veremos onde será e como será. Não há nada definido, pois nosso foco é a conclusão do complexo. Estamos vendo o que será possível fazer”, falou ele.
 
Tatá comentou os problemas envolvendo os trabalhos que já duram três anos. 
 
Segundo Prefeitura faltam apenas algumas obras para concluir reforma - Foto: Rodrigo Moraes/TV Caboquinho
 
Foram muitas intercorrências. Não é um trabalho fácil de ser executado. Uma delas foi o desbarrancamento do Rio Madeira, onde tivemos que fazer uma reparação daquele espaço, onde foi feito um enrocamento com pedras, que demorou certo tempo. Outro fator foi a pandemia, que reduziu bastante a força de trabalho dentro do complexo, que foi feita por etapas. Tivemos que aguardar tudo isso”.
 
Em nota enviada à redação do jornal eletrônico, a Prefeitura detalhou como ficará o espaço depois de pronto, mas sem data definida para entrega. 
 
“A previsão é entregar o novo espaço restaurado este ano. As obras finais contemplam a reforma da Estação Conforto, reforma do deck em madeira da orla, pavimentação da área externa, aquisição e instalação de bancos e lixeiras, paisagismo de áreas externas e instalações elétricas e dispositivos de iluminação”.
 
Ainda de acordo com a Funcultural, uma festa já está sendo planejada para os 110 anos da EFMM - Foto: Rodrigo Moraes/TV Caboquinho
 
E ainda: “Além da revitalização, algumas construções foram acrescentadas ao complexo. Os galpões 1 e 2 serão destinados para as peças de museu da EFMM, onde também haverá um mezanino. O galpão 3 será reservado para instalar quatro restaurantes, com mezanino com vista para o Rio Madeira. O espaço vai ganhar 12 lojas, nos moldes de uma pequena galeria comercial e quiosques que vão comportar seis lanchonetes e exposição das locomotivas”.
 
Fora de área
 
Tentamos contato com os representantes dos ex-ferroviários para serem ouvidos nesta reportagem, mas até o fechamento deste texto, não tivemos retorno. 
 
Também tentamos contato com o superintendente do Patrimônio da União em Rondônia, João Nogueira, mas ele afirmou que só irá se manifestar sobre as menções feitas a ele após a publicação do Rondoniaovivo.
 
São 12 anos de obras e muita gente acredita que a EFMM deveria estar aberta há muito tempo - Foto: Rodrigo Moraes/TV Caboquinho

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