Numa estada rápida em Porto Velho, tive a feliz oportunidade de assistir ao show de pré-lançamento do CD “Pirarublue Canta Noel - Acústico”; nova produção dos artistas rondonienses Sandro Bacellar e Gioconda Trivério.
Um trabalho de pesquisa musical, lançado no mercado brasileiro, o CD é um excelente resgate da história e da música de um dos maiores compositores brasileiros, Noel de Medeiros Rosa, também cantor, bandolinista e violonista, que faleceu, precocemente, aos 26 anos, vítima de tuberculose.
Gioconda e Sandro se apresentaram na Praça das Caixas D’Água, oferecendo ao público portovelhense, oportunidade imperdível de ver e ouvir coisa boa. Mas foi no Bar do Ruy que, cantando e dançando, assisti a dupla interpretar 14 composições do “Poeta da Vila”, escolhidas cuidadosamente pela produção do CD - em que Sandro e Gioconda homenageiam, com belas interpretações e arranjos fiéis aos originais, o compositor que morreu há 70 anos.
São sambas, boleros, choros e marchinhas compostas entre 1929 e 1936; período em que Noel compôs 259 músicas, com mais de 50 parceiros. No espetáculo, os intérpretes se revezam cantando canções e contando a história de Noel Rosa e suas músicas.
Trajando roupas de época, a dupla busca transformar o ambiente em tempos de outrora: Gioconda com um vestida azul, estilo melindrosa; Sandro, usando chapéu, camisa azul e calça branca, estilo Noel Rosa.
O show segue com os artistas interpretando “Com que roupa? (1929), música que estourou em 1930, e que até hoje ganha interpretações de astros famosos da Música Popular Brasileira. Depois vem um duo da bucólica “O Orvalho vem caindo” (1933) - de Noel e Kid Pepe - que transporta a platéia à década de 30 do século XX. Segue o show, com “Conversa de Botequim” (1935), música própria de um tempo em que ir ao bar era diletantismo; tempo em que não se via bicheiro ir preso por falcatruas.
“Feitiço da Vila” (1934) mostra o amor de Noel por Vila Isabel, bairro onde, como diz a canção, “bacharel” não temia “bamba”, e onde bom poeta, não tinha “Palpite Infeliz” (1935); música, aliás, em que Noel deu o recado de que na Vila não tinha gente interessada em “tirar patente”.
Era o tempo da famosa polêmica musical – iniciada em 1933 - entre Noel e o também compositor Wilson Batista. Briga, porém, que esteve anos luz de distância da tragédia diária que golpeia o Rio de Janeiro, nestes cotidianos de crônica violência urbana.
Na interpretação de “Feitio de Oração” (1933), a dupla mistura passado e presente com um som de guitarra e violão. O “Último desejo” (1937) de Noel chega a ouvidos atentos, por meio das vozes afinadas de Sandro e Gioconda, que dão passagem para Fita Amarela (1932); um duo muito bem interpretado, que, sem choro nem velas, prenuncia um clima carnavalesco.
Neste baile imaginário, as marchinhas “Pierrot Apaixonado” (1935), de Noel e Heitor dos Prazeres, e “Pastorinhas” (1934), de Noel com João de Barro, o falecido Braguinha, encerram o excelente show - produzido por Bado, que reuniu um time de músicos locais de primeira linha: Paulo Humberto (flauta), Júnior Lopes (percussão) e Aldísio (cavaquinho).
Prova de que a boa música nunca morre, o CD-show é, sem dúvidas, resultado excelente de uma pesquisa, que buscou resgatar um momento histórico da nossa música; um trabalho que se iguala-se ao que artistas como Marisa Monte faz, indo buscar essa história nos baús cariocas.
Alguém já disse que um povo que desconhece seu passado é um povo sem história. Como se pode verificar, nestes dias de conteúdos musicais duvidosos, esta máxima se aplica melhor quando se trata de música. Ratifique-se: de boa música.
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Edneide Arruda é Jornalista – DRT nº 587/PB
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