Sem querer ser prolixa, porém didática, julgo convir apontar alguns dados que entendo serem de extrema importância para a exposição de um pensamento que pode encontrar eco em algumas pessoas.
As Instituições Públicas de Ensino Superior, em todo Brasil (ou devo dizer, em todo o mundo) são referência e atuam em conjunto com a sociedade em prol do ensino de qualidade, pesquisas que trazem resultados efetivos a todo contexto social, e com projetos de extensão, os quais são formulados para benefício tanto da comunidade acadêmica, bem como da população em geral. O grupo de pessoas que faz parte de uma IES é constituído por: corpo docente, todos aqueles que dão suporte técnico-administrativo e especializado para a estruturação e manutenção do IES, e o corpo discente. Em tese, todo grupo possui o mesmo interesse: manter-se como referência por meio da atuação efetiva supracitada.
Entendo que não há a possibilidade de Universidades estarem descoladas do contexto sócio-político-cultural constitutivos de uma sociedade. Em sendo assim, estamos suscetíveis aos efeitos de gestão pública, tanto em contextos globalizados como locais. Também convém lembrar que estamos vivendo em um tempo de conexão de redes. Construindo uma analogia, com a atividade do tecelão: quando se puxa um fio do tecido, toda a malha o acompanha, toda rede é afetada.
Penso que, estando indubitavelmente suscetíveis aos efeitos que repercutem na sociedade de modo geral,temos de considerar que possuímos algumas peculiaridades, que fazem com que tenhamos uma identidade, que façamos parte de uma classe. Para discerni-las basta que façamos algumas perguntas basais: Quem somos? Quais nossos intentos e interesses? Qual nossa função social? Qual o impacto de nossas ações sobre o corpo social como um todo? A pretensão, ao trazer à tona essas questões, não é de elaborar respostas peremptórias, inquestionáveis, mas de provocara reflexão.
Não posso pensar uma Instituição Pública de Ensino Superior que não seja autônoma, democrática, participativa e atuante. Sem estes elementos estruturais não haveria exeqüibilidade de processos de ensino, pesquisa e extensão. Logo, temos de ser coerentes com essa estrutura que nos fornece sustentabilidade. Em outro dizer, nós mesmos (corpo social) contribuímos para a construção de ferramentas que façam valer nossos direitos (como classe) e efetivação dos processos que envolvem nosso labor.
Lembremos que foi por preço de sangue que conseguimos construir uma sociedade democrática, que não é ideal, no entanto é mais adequada a que muitos modelos anteriores. Em sendo assim, venho questionar: por que repetir um padrão fora de seu contexto? Por que negligenciar um preço tão caro, já pago? Ou seja, usar de violência para conquistar direitos que já nos foram garantidos, não me parecer ser coerente. Pode parecer ingênuo num primeiro momento este tipo de colocação, no entanto, julgo ser ingênuo pensar que por meio de violência colheremos mais bônus a que ônus.
Em outro dizer, as IES são ambientes de autonomia, diálogo e esclarecimento e não de batalha violenta, de agressão negligente e de ações intimidadoras. Ao menos parece ser assim hoje. Caso adotemos essa prática de enrijecimento do diálogo e agressão física e moral, estaremos descaracterizando nossa classe, e perdendo nosso foco, assim como nossa função social, pois este não é o modus operandi próprio dos ambientes de reflexão.
Foi difícil conquistar a autonomia do ambiente onde estamos inseridos, assim como foi difícil garantir o “ócio criativo”, que nos faz lembrar que não somos máquinas. Somos seres humanos. Não trabalhamos, ou melhor, não deveríamos trabalhar sob ameaças, de nenhuma espécie que seja, pois considero qualquer uma delas injustificáveis.
Transpondo essa perspectiva, das ações de paralisação, praticadas em contextos institucionais diversos, como bancos e correio, temos de pensar se este é de fato o modo de ação mais adequado e efetivo de ser aplicado à área da educação.
Pensemos no exemplo de uma fábrica, que decide paralisar sua produção. Supomos que após as negociações terem se desenvolvido positivamente, os mesmos voltam a produzir seus produtos na escala que estavam habituados. Educação não é produto, não “liga e desliga”. Quando se interrompe um processo educacional, não se volta a “produzir” de onde se parou, o processo tem de ser novamente construído, passo a passo, com novo começo e métodos adaptados ao novo contexto. Estamos falando de pessoas, não de produtos. Insisto que devemos pensar a educação como um todo, inclusive repensar nossas práticas de reivindicação.
Entendo que no afã e paixão de se fazer algo para melhorar o sistema se pense em “confronto”, ainda mais quando se está no vigor da juventude. Este parece ser o caminho mais fácil, radical e imediato. Atire a primeira pedra quem nunca pensou poder revolucionar e alterar, em um só tempo, todo o sistema social. No entanto, as boas intenções não garantem a efetivação de bons processos, este é apenas um dos muitos ingredientes que podem alterá-lo, mas, que usado de modo inadequado podem surtir em efeito contrário, produzir resultados devastadores, e se fazer perder o que se conquistou num preço de muitas vidas e ao longo de bastante tempo.
Por este motivo, meu temor em relação à repetição de ações que estejam desvinculadas de contexto ou mesmo temendo a proliferação de ações brutalizadas, que se opõe à busca de autonomia, reflexão, análise e mensuração de conseqüências e repercussão de nossas ações.
Diferente de outros períodos históricos, temos muitas ferramentas para conseguirmos o que julgamos ser melhor e adequado para nosso contexto, que não interrompa, ou mesmo comprometa o processo educacional. Ou seja, que não envolva atos de demonstração de força, violência ou mesmo de disputas de poder.
Precisamos nos concentrar em atos de demonstração de responsabilidade, de comprometimento,de envolvimento com que nos propusemos a fazer ao escolhermos fazer parte daclasse acadêmica. Por isso, também é fundamental que tenhamos claro qual o nosso comprometimento, quais nossas diretrizes, quais nossas ferramentas disponíveis para a melhoria dos processos de ensino, pesquisa e extensão.Lembremo-nos também de que ser pacífico não é sinônimo de ser passivo, estes são conceitos bastante distintos. Se pode ser bastante firme, incisivo e coerente sendo pacífico. Consideremos que em uma situação de conflito, o primeiro abranda e o segundo acomoda. Um outro extremo da pacificidade é justamente a violência, a agressão.
Tenho uma posição muito clara, que em nada me constrange expor, pelo contrário. Não sou política, escolhi ser professora e pesquisadora. Esta afirmação a faço com bastante consciência, clareza e reverência, e confesso que sinto certo repúdio e indignação ao ver o processo de ensino ser tratado como produto de negociação, de barganha ou mesmo de manobra, para se alcançar outros fins que não os pertinentes aos processos educacionais. Sinto-me indignada por só serem oferecidas duas posições possíveis: a favor ou contra a gestão. O que importa de fato é a educação, assim como o andamento e potencialidade dos processos de conhecimento, e não sua paralisação.
Alguém poderiafazer a colocação: Não há bons processos educacionais sem uma boa gestão. O que posso concordar plenamente. No entanto, diria: apresente uma proposta, organizada e clara, e melhor que a vigente, respeitando prazos e o andamento do sistema, e serei a primeira a adotá-la. No momento o que temos é a vigente.
Se se pensa “derrotar” a democracia dizendo que com o voto que se elegeu a gestão atual este agora não vale de nada, se faz isso em nome do quê? Não sei se me faço entender, mas apelo para que percebamos o que estamos fazendo, e quais as consequências dessas ações a curto, médio e longo prazos. O que percebo é que, agindo deste modo, ferimos nosso precioso sistema democrático, inclusive de participação de voto, o que não me parece nada justo, nem mesmo razoável, e que o façam em nome de todos, para benefícios de alguns.
Grosso modo, entendo por justo o que foi combinado democraticamente. Alterar as regras do jogo enquanto este está em execução é “brincar” com a vida das pessoas envolvidas. Após o término do processo acordado que se deve pensar novas regras, otimizá-las, e quanto maior o número de propostas, tanto mais ricamente este será pensado. Nada mais salutar revermos sempre nossos processos e pensá-los sempre tendo em vista intentos melhores.
Considerando os aspectos legais, ao qual acordamos e concordamos, indispensáveis. Não quero sentir-me cerceada em meu direito de cumprir o que foi combinado, o que me propus a fazer. Fiz minhas escolhas pautadas na confiança da idoneidade dos processos legais, que estão explicitados em nosso regimento como IES, de constituição Nacional. Caso estes não sejam cumpridos, tenho direitos garantidos e ferramentas legais que me permitem não interromper o processo no qual estou comprometida incondicionalmente, que foi uma de minhas escolhas mais significativas, que atribui sentido ao meu modo de ser no mundo. Com força e orgulho afirmo que meu compromisso é com o conhecimento, com a educação, por paixão e por dever.