Roteiro do jovem Lévi-Straus incluiu Vilhena, Pimenta Bueno, Porto Velho e Guajará - Por Paulo Queiroz

Política em Três Tempos

Roteiro do jovem Lévi-Straus incluiu Vilhena, Pimenta Bueno, Porto Velho e Guajará - Por Paulo Queiroz

Foto: Divulgação

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1 – MORRE LÉVI-STRAUS
 
O etnólogo e antropólogo estruturalista belga Claude Lévi-Strauss morreu na noite de sábado para domingo (1º) aos 100 anos, de acordo com um porta-voz da Escola de Estudos Avançados em Ciências Sociais de Paris, na França. As informações são do jornal francês "Le Monde", que só na terça-feira anunciou o fato
 
Em meados de 1938, o antropólogo - então a serviço da nascente Universidade de São Paulo (USP) - passou por Vilhena, Pimenta Bueno, Porto Velho e Guajará Mirim recolhendo o material a partir do qual produziria uma obra capaz vincar para sempre a cultura ocidental e de alargar inexoravelmente as fronteiras mesmas da civilização. É o registro dessa viagem, publicado no livro "Tristes Trópicos" (1955), que lhe trará a fama internacional. Nessa obra ele conta como sua vocação de antropólogo nasceu durante as viagens ao interior do Brasil.
 
Aqui, especialmente em Rondônia, que ainda não tinha essa identidade em 1938, ano em que Lévi-Strauss liderou a expedição à Serra do Norte (MT), o antropólogo realizou suas primeiras e mais importantes pesquisas. Mas Pimenta Bueno já era uma localidade conhecida com esse nome (batizada assim por Rondon enquanto posto telegráfico) e foi lá que a expedição montou acampamento. Parte da viagem do antropólogo por Rondônia, sua passagem por Porto Velho e Guajará Mirim, está relatada no livro "Retratos Brasileiros dos Tristes Trópicos", do etnólogo brasileiro Castro Farias, que acompanhou a expedição.
 
Quando completou 100 anos, em 27 de novembro passado, por iniciativa do também antropólogo Ari Ott, o pessoal do Departamento de Sociologia e Filosofia da Universidade Federal de Rondônia (Unir) promoveu, numa quinta-feira, no auditório das instalações centrais da instituição (Unir-Centro), um debate amparado por uma mesa redonda e a exibição de um filme (documentário). Com uma hora e 57 minutos de duração, o filme – da documentarista Maria Maia - incluiu 40 minutos de abordagem com Lévi-Strauss, entrevistado às vésperas de completar 98 anos, em Paris, num depoimento que funciona como fio condutor de toda a obra.
 
2 – NO BRASIL
 
Nascido em Bruxelas, na Bélgica, Lévi-Strauss foi um dos grandes pensadores do século 20. Ele, que completaria 101 anos em 27 de novembro, tornou-se conhecido na França, onde seus estudos foram fundamentais para o desenvolvimento da antropologia. Filho de um artista e membro de uma família judia francesa intelectual, estudou na Universidade de Paris. De início, cursou leis e filosofia, mas descobriu na etnologia sua verdadeira paixão. No Brasil, lecionou sociologia na recém-fundada USP, de 1935 a 1939, e fez várias expedições ao Brasil central.
 
O período brasileiro de Lévi-Strauss, embora curto (vai de 1935 a 1939, como professor visitante da Universidade de São Paulo-USP), é fundamental para o desenvolvimento posterior de sua obra e carreira. A partir dessa experiência, o jovem professor de filosofia torna-se um etnólogo, um americanista: inicia-se na prática etnográfica, expõe em museus e galerias francesas o material coletado e publica seus primeiros textos na área. Sua produção, ainda que mescle informações etnográficas de várias regiões americanas, apóia-se, em larga medida, na etnografia realizada no Brasil.
 
Em 1955 ele escreve um livro inteiramente dedicado às viagens em território brasileiro. É bom lembrar, entretanto, que "Tristes Trópicos" não é um simples relato da experiência brasileira do antropólogo (embora também o seja), nem um retrato do país (ainda que o compreenda). Trata-se de um livro que parte do período brasileiro do autor, mas que se descola dele, alçando outros vôos. Diz ele, em “Tristes Tópicos”: "Um ano depois da visita aos Bororo, todas as condições para fazer de mim um etnógrafo estavam satisfeitas...".
 
A partir de 1988 o Brasil passa a ocupar um espaço importante nas reconstituições autobiográficas do etnólogo, sobretudo em depoimentos publicados na França, onde é apresentado o material de sua experiência de campo brasileira. Em 2002, sai publicado aqui “Lévi-Strauss: Saudades do Brasil”, uma seleção das belíssimas fotografias tiradas nos anos 30 pelo então jovem antropólogo.
 
3 – EM RONDÔNIA
 
"Minha carreira foi decidida num domingo do outono de 1934, às 9h, num telefonema", conta ele em "Tristes Trópicos", o livro que o tornou conhecido do grande público como escritor. Livro inclassificável, espécie de microcosmo de toda a obra. O tal telefonema era um convite para vir dar aulas na recém-fundada Universidade de São Paulo, onde poderia, disseram-lhe, fazer pesquisa com os índios nos arrabaldes da cidade.
 
Os índios estavam bem mais longe, mas o trabalho de campo entre eles, indispensável para obter suas "credenciais de etnólogo", seria realizado aqui, especialmente em terras que hoje se conhece por Rondônia - insiste-se a guisa de habilitar o pedaço como parte afetiva legítima destas comemorações. Enfim, Lévi-Strauss descreve o Brasil, sobretudo em "Tristes Trópicos" (mas também na introdução a "Saudades do Brasil", de 1994), com cheiro, ruído, tato, paladar, audição e visão, operando constantemente com códigos sensoriais, como que prefigurando o que de mais significativo marcará sua obra.
 
Também descreve a natureza, homenageando paisagens como a do litoral entre Santos e o Rio de Janeiro, a que chama de "trópicos de sonho". Ou Goiás Velho, um conjunto de "fachadas degradadas" tomadas por cipós, bananeiras e palmeiras. E Goiânia, "uma planície interminável, misto de terreno baldio e campo de batalha, espetado com postes elétricos e estacas de medição". A São Paulo da década de 1930 lhe parecia ser um exemplo típico das cidades americanas, de ciclo curto, sempre a "meio caminho entre o canteiro de obras e a ruína".
 
 
É outro o Brasil que marca a vida e a obra de Lévi-Strauss. O Brasil que faz dele um americanista e inflete sua produção intelectual é aquele em que vivem nambiquaras, bororos, cadiuéus, tupi-cavaíbas, tupi-mondés... o Brasil centrado em Pimenta Bueno. O que foi decidido naquele imprevisível telefonema levaria Lévi-Strauss a ser um americanista com uma entrada "brasileira", ou um europeu que encontra a América no Brasil e este em Rondônia.  
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