O deputado estadual evangélico Valter Araújo (PTB), da Igreja Assembléia de Deus, foi condenado pelo Tribunal de Justiça de Rondônia a pagar R$1.068,60 em indenização por perdas e danos à Marta Maria Rodrigues Teixeira, que teve a cerca destruída e a propriedade rural esbulhada pelo parlamentar. Segundo o dicionário, esbulhar significa desapossar violentamente, desapoderar, despojar, espoliar, usurpar.
Marta Maria Rodrigues Teixeira apelou ao Tribunal de Justiça de Rondônia alegando que ajuizou ação de reintegração de posse em face do esbulho sofrido na sua posse sobre o imóvel rural constituído pelo lote 28, com área de 56,9633ha, perímetro 3.814,39m, da gleba 18, Projeto Fundiário Alto Madeira.
A medida liminar de reintegração de posse a seu favor foi concedida, mas o juízo de primeiro grau julgou improcedente o pedido referente à perdas e danos.
Ela juntou documentos ao processo que demonstraram a culpa de Valter Araújo, por perdas e danos materiais, bem como a responsabilidade do parlamentar pelo corte dos arames da cerca divisória da propriedade.
Segundo a proprietária, não restam dúvidas do esbulho sofrido, inclusive no decorrer da ação na justiça, quando já havia sido deferida e cumprida a liminar.
O desembargador Kiyochi Mori, relator do processo no TJ, anotou que consta registrado no boletim de ocorrência que Valter Araújo, vizinho de Marta Teixeira, cortou os arames da cerca divisória, invadiu a propriedade, colocando em seu pasto aproximadamente 100 cabeças de gado, fatos estes que demonstram a ocorrência do esbulho.
Segundo consta do processo, os fatos narrados no boletim de ocorrência estão comprovados por fotografias que demonstram o corte dos arames da cerca, bem como o gado no pasto de Marta Teixeira. Inclusive o trânsito de gado no local foi verificado pelo perito judicial.
Ao contestar a ação, Valter Araújo não negou a prática do esbulho. Também não negou que o gado no pasto da vizinha seja seu.
”Á luz desses fatos, não há como negar que o recorrido praticou esbulho na área da recorrente, insistindo em tal prática mesmo após o cumprimento da liminar de reintegração de posse, quando tentou intimidar as pessoas que estavam consertando a cerca destruída, conforme atesta o boletim de ocorrência”, anota o desembargador.
Os juízes Edenir Sebastião da Rosa e Raduam Miguel Filho acompanharam o voto do relator pela condenação do deputado.
VEJA A DECISÃO NA ÍNTEGRA
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA
Tribunal de Justiça
1ª Câmara Cível
Data de distribuição: 27/06/2007
Data de julgamento: 17/07/2007
100.001.2002.001208-9 Apelação Cível
Origem: 00120020012089 Porto Velho/RO (3ª Vara Cível)
Apelante: Marta Maria Rodrigues Teixeira
Advogados: Raimundo Gonçalves de Araújo (OAB/RO 3.300) e outra
Apelado: Walter Araújo Gonçalves
Advogados: Joselia Valentim da Silva (OAB/RO 198) e outros
Relator: Desembargador Kiyochi Mori
Revisor: Juiz Edenir Sebastião A. da Rosa
RELATÓRIO
Marta Maria Rodrigues Teixeira, inconformada com a sentença do juiz a quo, que julgou improcedente a ação de reintegração de posse c/c perdas e danos, interpôs recurso de apelação.
Alinha que ajuizou ação de reintegração de posse em face do esbulho sofrido na sua posse sobre o imóvel rural constituído pelo Lote 28, com área de 56,9633ha, perímetro 3.814,39m, da Gleba 18, Projeto Fundiário Alto Madeira.
Que foi concedida medida liminar de reintegração de posse em seu favor, no entanto, no mérito, o juiz a quo, acreditando não ter restado configurado o esbulho por parte do réu, bem como não ter sido comprovada a autoria daquele, reconheceu a sua posse, porém, julgou improcedente o pedido referente às perdas e danos.
Afirma que os documentos carreados aos autos demonstram a culpa do recorrido pelas perdas e danos materiais mencionados na exordial, bem como a sua responsabilidade pelo corte dos arames da cerca divisória das propriedades.
Sustenta que não restam dúvidas do esbulho sofrido, inclusive no decorrer da ação, quando já havia sido deferida e cumprida a liminar.
Requer, ao final, seja dado provimento ao recurso, condenando o apelado em indenização por perdas e danos nos termos da inicial, ou, alternativamente, em decidindo manter a sentença recorrida, seja reduzida a verba de honorários advocatício de sucumbência para 10%.
O apelado apresentou contra-razões, às fls. 242/247, pugnando seja não provido o recurso, declarando o recorrente litigante de má-fé por ser o recurso meramente protelatório, aplicando-lhe as penas da lei.
Pleiteia, ainda, seja majorado a verba honorária em decorrência do recurso interposto, nos termos da alínea c do art. 20 do CPC.
É o relatório.
VOTO
DESEMBARGADOR KIYOCHI MORI
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
Trata-se de ação de reintegração de posse, interposta por Marta Rodrigues Teixeira, em razão de esbulho sofrido em sua posse sobre o imóvel rural constituído pelo Lote 28, com área de 56,9633ha, perímetro 3.814,39m, da Gleba 18, Projeto Fundiário Alto Madeira .
A ação foi julgada improcedente, sob o fundamento de inexistir nos autos provas do ato esbulhatório.
A doutrina e a jurisprudência nos ensinam que as ações possessórias visam à proteção da posse.
A ação de reintegração de posse é utilizada pelo possuidor que é esbulhado em sua posse, não mais podendo exercê-la plenamente, para tanto, incumbe-lhe o ônus de fazer prova da posse anterior, do esbulho praticado pelo réu e a data desse.
A respeito preceitua o Código Civil:
Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de vinolência iminente, se tiver justo receio de ser molestado.
O Código de Processo Civil complementa:
Art. 927. Incumbe ao autor provar:
I - a sua posse;
II - a turbação ou o esbulho praticado pelo réu;
III - a data da turbação ou do esbulho;
IV - a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção; a perda da posse, na ação de reintegração.
Os ilustres Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, ao comentar a matéria no Código Civil Comentado, 3ª ed, Editora RT, pág. 619, lecionam:
Reintegração de posse. A ação de força espoliativa é o remédio utilizado para corrigir agressão que faz cessar a posse. Tem caráter corretivo, mas para valer-se dela o autor tem que provar: a) a posse ao tempo do esbulho; b) que essa posse, com relação ao réu, não tenha se constituído de maneira viciosa; c) que o réu, por si ou por outrem, praticou os atos; e d) que os atos foram arbitrários[...]
Daí decorre que para o manejo desta ação deve estar devidamente comprovado a posse, o esbulho, a perda da posse e a sua duração, desse modo, o recurso deve ser apreciado com base nesses requisitos legais.
O exercício da posse pela recorrente é incontestável, tendo restado amplamente provado pelos documentos que acompanharam a inicial, inclusive reconhecido pela sentença guerreada.
Resta agora verificar se o segundo requisito, o esbulho praticado pelo réu, restou demonstrado pelo autor.
No caso em testilha, o esbulho praticado pelo réu consiste na destruição da cerca edificada na divisa das áreas.
A prova pericial assevera que, em vistoria realizada no local onde ocorreu o esbulho, verificou-se o trânsito de gado de uma área para a outra, mas não constatou-se elementos materiais suficientes para afirmar que a violação da cerca foi proveniente de conduta humana, sendo que pode ter ocorrido em razão da má conservação da cerca.
Não obstante o Sr. Perito Judicial afirme que a cerca divisória encontra-se destruída, inclusive com trânsito de semoventes, é evasiva ao esclarecer o modo como ocorreu a destruição.
É cediço que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar a sua convicção com outros elementos ou fatos constantes nos autos.
A esse respeito essa e. Corte já decidiu:
Apelação cível. Execução de sentença. Laudo pericial. Livre apreciação das provas. Liquidação de sentença. Arbitramento do lucro cessante. Possibilidade.
Na livre apreciação das provas para formar a sua convicção, o Juiz não se acha adstrito aos laudos periciais, podendo, para o seu juízo, valer-se de outros elementos de prova existentes nos autos. E, se o autor não consegue demonstrar o quantum correspondente aos lucros cessantes, cabe ao Magistrado arbitrar o valor ao julgar a liquidação, já que a ele a lei confia a responsabilidade pessoal e direta da prestação jurisdicional.( Apelação Cível n. 20000020000015911, Rel. Des. Sebastião Teixeira Chaves, J. 19/12/2000)
Inserto nessa orientação, passo a apreciar as demais provas carreadas aos autos.
Consta registrado no Boletim de Ocorrência, fl. 17, que o recorrido, que é vizinho da recorrente, cortou os arames da cerca divisória, invadiu a propriedade, colocando em seu pasto aproximadamente 100 cabeças de gado, fatos estes que demonstram a ocorrência do esbulho.
Os fatos narrados no Boletim de Ocorrência estão corroborados pelas fotografias de fls. 36, 39, 43/45, 127, 132, 133, 170 e 172/173, as quais demonstram o corte dos arames da cerca, bem como o gado no pasto da recorrente, inclusive, o trânsito de gado no local foi verificado pelo Sr. Perito.
O réu, ao contestar a ação, não negou a prática do esbulho. Em sede de alegações finais, as suas argumentações se limitam ao constante na prova pericial, porém em momento algum nega veementemente tenha praticado o esbulho.
Por outro lado, o recorrido também não nega que os semoventes que estavam no pasto da recorrente, conforme demonstra a fotografia de fl. 133, não lhe pertencem.
Outrossim, à luz desses fatos, não há como negar que o recorrido praticou esbulho na área da recorrente, insistindo em tal prática mesmo após o cumprimento da liminar de reintegração de posse, quando tentou intimidar as pessoas que estavam consertando a cerca destruída, conforme atesta o Boletim de Ocorrência de fl. 88.
Porquanto, presentes estão os pressupostos necessários para a procedência da ação de reintegração de posse, quais sejam, posse anterior, esbulho e perda da posse.
Pleiteia, ainda, a recorrente, a procedência do pedido de indenização por perdas e danos, suportados em decorrência do esbulho praticado pelo recorrido.
Repisa-se, pois, que as fotografias de fls. 36, 39, 43/45, 127, 132, 133, 170 e 172/173 demonstram a deteriorização ocorrida no imóvel invadido, consistente no corte dos arames da cerca divisória das propriedades.
O possuidor de má-fé responde pela perda ou deteriorização a que der causa, conforme preceitua o Código Civil:
Art. 1.218. O possuidor de má-fé responde pela perda, ou deterioração da coisa, ainda que acidentais, salvo se provar que de igual modo se teriam dado, estando ela na posse do reivindicante.
O recorrido é possuidor de má-fé, foi o responsável pelo deteriorização da cerca, porquanto tem o dever de indenizar os danos causados.
As notas fiscais e o recibo da mão-de-obra, acostados às fls. 89/92, demonstram que a apelante teve gastos no importe de R$1.068,60 (mil sessenta e oito reais e sessenta centavos) para reconstruir a cerca destruída, porquanto faz jus a ser ressarcida nesse valor, pelo recorrido, uma vez que este era possuidor de má-fé.
Em face do exposto, e por tudo que dos autos consta, dou provimento ao recurso e condeno o recorrido a pagar à recorrente as perdas e danos, no valor de R$1.068,60 (mil sessenta e oito reais e sessenta centavos), devidamente corrigido desde a data do efetivo desembolso, documentos de fls. 89/92, acrescido de juros de mora a partir da citação.
Condeno, ainda, o recorrente ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios de sucumbência, o qual fixo em 15% (quinze por cento) sobre o valor da causa.
É como voto.
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA
Tribunal de Justiça
1ª Câmara Cível
Data de distribuição: 27/06/2007
Data de julgamento: 17/07/2007
100.001.2002.001208-9 Apelação Cível
Origem: 00120020012089 Porto Velho/RO (3ª Vara Cível)
Apelante: Marta Maria Rodrigues Teixeira
Advogados: Raimundo Gonçalves de Araújo (OAB/RO 3.300) e outra
Apelado: Walter Araújo Gonçalves
Advogados: Joselia Valentim da Silva (OAB/RO 198) e outros
Relator: Desembargador Kiyochi Mori
Revisor: Juiz Edenir Sebastião A. da Rosa
EMENTA
Apelação cível. Ação de reintegração de posse. Perícia. Juiz não está adstrito. Possuidor de má-fé. Obrigado à indenizar perdas e danos.
A norma processual confere ao juiz a liberdade de apreciação e a valoração das provas na formação de seu convencimento, não ficando adstrito à conclusão do laudo pericial.
O possuidor de má-fé tem a obrigação de indenização os danos causados no imóvel por ele esbulhado.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Desembargadores da 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, em,
POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO AO RECURSO NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.
Os Juízes Edenir Sebastião A. da Rosa e Raduan Miguel Filho acompanharam o voto do Relator.
Porto Velho, 17 de julho de 2007.
DESEMBARGADOR KIYOCHI MORI
PRESIDENTE EM SUBSTITUIÇÃO REGIMENTAL E RELATOR
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