CINE BRASIL - A última sessão de cinema - Por: Marcos Souza

CINE BRASIL - A última sessão de cinema - Por: Marcos Souza

CINE BRASIL - A última sessão de cinema - Por: Marcos Souza

Foto: Divulgação

Receba todas as notícias gratuitamente no WhatsApp do Rondoniaovivo.com.​

Andar na calçada da avenida Sete de Setembro, no trecho que compreende a avenida Presidente Dutra e a rua José de Alencar, centro da capital, é como relembrar um trecho da história urbana de um monumento que deverá perecer em instantes, como um facho de luz que se perde na escuridão do espaço. Olha-se para um velho prédio reformado, um cinema que encantou gerações, teve o seu apogeu e decadência, mas nunca deixou de representar o velho e histórico Cine Brasil, o mais antigo de Porto Velho em atividade (até então) – como está descrito em sua placa, funcionando desde 1939 -. Era aquele cinema pequeno, que encantou uma geração de fãs de filmes de kung fu e western, nas décadas 70 e 80, e que ainda há muito tempo nunca deixou de exibir uma velha cópia de um filme que contava a história da paixão de Cristo, tão desgastado que do preto e branco passou para o sépia, e que era a atração principal na semana Santa em Porto Velho. Do sagrado ao profano, ainda lembro que o primeiro filme pornô brasileiro da história, “Coisas Eróticas”, era um campeão de bilheteria entre os públicos adulto e adolescente – este que, em sua grande maioria, teimava em ignorar suas espinhas púberes e enganar o laterninha, que tinha, vá lá, o seu papel de censor por faixa-etária. Enquanto o então poderoso Cine Lacerda exibia os filmes mais contemporâneos, com atrasos de um a dois anos de seu lançamento nos grandes centros do país, o velho Cine Brasil, que era co-irmão do Cine Teatro Resky – lembrando que ambos então pertenciam à família Resky – exibia reprises de westerns italianos (preferido do público masculino por ser mais violento e óbvio) como “Uma pistola para Ringo”, “Django”, “O Dólar Furado” e “Trinity”, ou os incríveis filmes de artes-marciais com os imitadores do mestre Bruce Lee, que tinham nomes semelhantes, como: Bruce Li, Bruce Ly ou ainda Bruce Lei, em filmes como “A vingança de Shaolim”, “Guerreiros do Templo de Shaolin” e “Punhos de aço”. Apesar do que parecia ser uma típica programação defasada e repetitiva, tinha lá o seu público e manteve durante muito tempo como ponto de referência para um público menos exigente, de baixa renda e que se divertiu muito. Antes de 1939 a sala pertencia a João Pedro da Rocha, conhecido como João Barril, e se chamava Cine Rocha, quando vendeu para a família Resky, George Resky mudou o nome para Cine Catega. Porém, quando passou para a firma Resky & Cia., ficou com o nome que até hoje permaneceu, Cine Brasil. Nos anos noventa foi arrendado, passando inclusive pelas mãos do proprietário do jornal O Guaporé, Miguel Monte, que chegou a trazer filmes modernos e cults, como “Fervura Máxima”, do diretor John Woo, e “Parceiros do Crime”, de Roger Avary. Com a retomada do velho prédio do Cine Brasil e a sua reforma, bons ventos trouxeram, que o diga o filme “Anaconda”, que se tornou, com certeza, o mais estrondoso sucesso da velha sala de projeção, com filas monumentais, que dobravam esquinas. Triste ver que o passar dos anos trouxe um grande veio de destruição para essa pequena fábrica de ilusões que encantou gerações em Porto Velho, a pirataria de DVDs, que, como uma onda terminal, um tsunami devastador, fechou locadoras e agora, num momento desolador, faz a sua primeira vítima com uma sala de exibição. Quem passa em frente ao Cine Brasil se choca com a placa que diz: “PIRATARIA FECHA CINEMA – Última sessão 30/10”. Nos altos da sua placa, uma pequena faixa de ALUGA-SE. A última sessão de cinema do Cine Brasil encerra um ciclo de história de entretenimento e cultura, o fim de uma reminiscência pioneira de Porto Velho, um legado social de épocas e pessoas. Mais triste ainda é saber que dona Francisca Guimarães, uma senhorinha inofensiva e que por vezes circula entre a bilheteria e as cortinas de acesso às cadeiras, proprietária do Cine Brasil, não disponibilizará filmes para pessoas que devido à baixa renda tinham como escape aquela sala. Os ingressos a três reais eram os mais baratos da capital, mas bater de frente com as dezenas, centenas e milhares de DVDs piratas, muitos vendidos em promoções oportunistas, como levar três filmes por um preço de 10 reais, era pura covardia. Dói saber que o comércio ilegal de DVDs, espalhado pela principal avenida do centro comercial da capital, e praças vizinhas do cinema, minaram de uma tal forma os que trabalham dentro da legalidade, que para sobreviver precisam fechar estabelecimentos, exterminar sonhos, diluir patrimônios e buscar novos meios de viver. Incrível, mas é verdade, o dia 30 de outubro de 2007 ficará marcado como o dia em que o publico de cinema, apreciador da sétima arte, amante fiel da película exibida em uma tela, dentro de uma sala escura, teve a rara oportunidade de conhecer a última sessão de cinema, não de qualquer cinema, mas do mais importante e pioneiro cinema do Estado de Rondônia. E pensar que daqui a dois anos o Cine Brasil faria 70 anos. Só para lembrar, o filme que fecha esse ciclo e estará em cartaz na última sessão, o das 20h30, é: “O homem que desafiou o diabo”. Caberia até uma analogia oportuna, mas é desnecessária e de mau gosto, resta torcer para que o cinema lote e um bom público veja o que é ter um pedaço de história se partir. Marcos Souza é editor-chefe e fã de cinema
Direito ao esquecimento
Os comentários são responsabilidades de seus autores via perfil do Facebook. Não reflete necessariamente a opinião do Rondoniaovivo.com
Você acredita que o Código Penal e a Lei de Execução Penal devem ser endurecidos?
Quem tem sua preferência em uma possível candidatura para o Senado Federal?

* O resultado da enquete não tem caráter científico, é apenas uma pesquisa de opinião pública!

MAIS NOTÍCIAS

Por Editoria

PRIMEIRA PÁGINA

CLASSIFICADOS veja mais

EMPREGOS

PUBLICAÇÕES LEGAIS

DESTAQUES EMPRESARIAIS

EVENTOS