Uma pesquisa revelou que, nos últimos 15 anos, o número de famílias chefiadas por mulheres aumentou mais de 10 vezes no Brasil e saltou de 301 mil, em 1993, para 3,6 milhões, em 2007. No entanto, na maioria das unidades da federação observa-se que o rendimento mensal dos domicílios chefiados por mulheres ainda é inferior àquele dos domicílios cujos chefes são do sexo masculino.
Os dados fazem parte da pesquisa “Retrato das desigualdades de gênero e raça”, realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), em parceria com a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM), o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e o Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (Unifem) e mostra, ainda, que apesar dos salários inferiores, houve um aumento do nível educacional das mulheres, que atualmente é superior ao dos homens.
Esta é também uma evidência da necessidade de políticas públicas que promovam a participação das mulheres em concursos públicos, uma vez que, além de serem as principais responsáveis pelas atividades domésticas e pelo cuidado com os filhos e demais familiares, o que representa uma sobrecarga para aquelas que também realizam atividades econômicas.
Segundo uma verificação realizada pelo curso preparatório GranCurso Online, as mulheres compõem a maioria dos alunos e representam cases de sucesso na instituição. A pesquisa revela que 35,5% são mulheres, contra 26,70% de alunos do sexo masculino. Outros 37,8% dos alunos não responderam.
Este é o caso da Jhenneffer Silva, 28 anos, enfermeira obstétrica da Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SESDF) e do Hospital Universitário (HUB-UNB). Para alcançar a nomeação em um cargo público, a profissional precisou recorrer ao curso online, pois na rotina entre trabalho e estudos, não cabia ainda um curso preparatório. Ela conta que precisou vencer o cansaço e abdicar de momentos de lazer, descansos e viagens para estudar e alcançar a tão sonhada nomeação.
“Hoje somos milhares de mulheres que ocupam cargos de liderança, segurança, assistência, educação, gestão etc. O concurso público, nesse cenário, fortalece o empoderamento e liberdade feminina. Sabemos que por muitos anos as mulheres viveram dependentes financeiramente de seus parceiros. Então, hoje, uma mulher poder assumir um cargo público, que trará estabilidade e uma boa remuneração é uma conquista e uma possibilidade de mudança de vida”, afirma Jhenneffer.
A enfermeira conta que nasceu no interior de Goiás, em uma família humilde, e foi uma das primeiras da família a cursar ensino superior e a assumir um cargo público. “Hoje, através do meu cargo, consigo ajudar minha família e nos proporcionar momentos e experiências que jamais imaginamos viver. A estabilidade e liberdade financeira que adquiri após a minha nomeação mudou completamente a minha vida”, desabafa Jhenniffer, ao contar que se emociona ao observar a própria trajetória.
Ela ainda homenageia outras mulheres que contribuíram para a sua colocação no setor público: “não seria possível se eu não tivesse sido fortalecida por tantas outras mulheres, como minha mãe, madrasta, avó, tias, primas, amigas e irmã”, diz.
Avanços em políticas públicas para mulheres concurseiras
Apesar do cenário ainda ser de desigualdade e sobrecarga da mulher, é possível observar pequenos avanços que fomentam a participação feminina em concursos públicos.
Na Câmara dos Deputados tramita um Projeto de Lei (PL) 3510/2020, de autoria do deputado Alexandre Frota (PSDB/SP), que estabelece o mínimo de 15% dos cargos públicos, ofertados em concursos públicos, para mulheres. A deputada Rejane Dias (PT PI), anexou ainda, ao mesmo texto, uma proposta que prevê que 20% das vagas dos concursos públicos sejam reservados ao sexo feminino. A proposta, no entanto, está há um ano sem novas tramitações.
Já no Distrito Federal, uma portaria foi publicada em outubro de 2021 dispondo sobre a exigência de conhecimento nos certames públicos distritais sobre o Plano Distrital de Política para Mulheres, que representa um conjunto de propostas de políticas públicas elaboradas por órgãos governamentais, não governamentais e sociedade civil.
A proposta busca garantir a igualdade das mulheres e combater a discriminação de gênero. O documento apresenta nove eixos, cada um deles possuindo uma série de objetivos gerais.
Os nove eixos são:
Eixo 1 – Igualdade no Mundo do Trabalho e Autonomia Econômica
Eixo 2 – Educação para Igualdade
Eixo 3 – Saúde Integral das Mulheres, Direitos Sexuais e Reprodutivos
Eixo 4 – Enfrentamento de Todas as Formas de Violência contra as Mulheres
Eixo 5 – Participação das Mulheres nos Espaços de Poder e Decisão
Eixo 6 – Igualdade para as Mulheres Rurais Eixo
7 – Cultura, Esporte Comunicação e Mídia Eixo
8 – Enfrentamento do Racismo, Sexismo, Lesbofobia e Transfobia
Eixo 9 – Igualdade para Mulheres Jovens, Mulheres Idosas e Mulheres com Deficiência
Em Pernambuco, a Comissão de Justiça aprovou a proposta que prevê 20 % de cotas para mulheres que prestarem concursos para polícia civil, militar e penal do Estado. A comissão considerou a ação como asseguradora do artigo 5º da Constituição Federal.
“Na esfera dos concursos públicos, a política de cotas constitui um mecanismo de acesso a cargo ou emprego público que visa mitigar um processo histórico-social de exclusão e de ausência de oportunidades imposto a determinada parcela da população”, indica o relatório da comissão.
Em São Paulo foi aprovado um projeto que define que ao menos 60% dos cargos ocupados por servidores públicos nas Delegacias de Polícia de Defesa da Mulher de SP deverão ser preenchidos por mulheres. De acordo com o autor da proposta, deputado João Lobato (PV), o PL foi elaborado para que mulheres que recorrem ao atendimento à delegacia da mulher não se sintam constrangidas para fazer a denúncia em um caso que pode envolver situações traumáticas de violência física, moral ou sexual.
“Seria uma segunda agressão ela não se sentir à vontade para ser atendida em uma Delegacia da Mulher”, disse Lobato.
Na contramão da equidade
Apesar desses avanços, em alguns estados a desigualdade de gênero segue escancarada. Em junho de 2021, o Tribunal de Justiça de Roraima precisou determinar que o governo convocasse cerca de 50 mulheres para a Polícia Militar do estado. Isso porque, na época em que o certame foi realizado, 400 vagas foram abertas para o cargo de soldado, sendo 340 direcionadas para homens e 60 para mulheres. A divisão das oportunidades foi considerada inconstitucional pelo Tribunal de Justiça.
No Amazonas, em outubro do mesmo ano, o deputado Wilker Barreto (Podemos) questionou as medidas da Mensagem Governamental nº 115/2021, que altera a Lei de ingresso na Polícia Militar do Amazonas (PMAM). Além de aumentar de 28 para 35 a idade máxima de ingresso na corporação, o projeto também destina apenas 10% das vagas do concurso previsto para o sexo feminino.
“É uma afronta uma mensagem de concurso público limitar a participação das mulheres em 10%. A policial feminina treinada e equipada é tão eficiente quanto o homem, 10% de um estado que tem 55% da população feminina é um contrassenso”, expressou Wilker.
“Já que a Mensagem está aqui nesta Casa, cabe a nós corrigi-la e devolvê-la conforme preconiza as legislações e deixarmos que a mulher e o homem escolham a sua carreira de vida, porque polícia é vocação”, propôs o deputado.
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