Política em Três Tempos
1 – TERCEIRO MANDATO
Pelo menos quatro deputados federais, dos oito da representação da maloca, estão entre os 176 parlamentares cujas assinaturas acabam de ser reconhecidas pela Secretaria Geral da Mesa Diretora da Câmara, em Brasília, como as que tornaram possível o início da tramitação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que introduz o terceiro mandato para o Executivo – prefeitos dos municípios, governadores dos Estados e Presidente da República - na legislação eleitoral.
Como o presidente Luís Inácio Lula da Silva (PT) não tem nada a ver com o peixe – aliás, tem jurado de pés juntos que não quer ver ou sequer ouvir falar dessa marmota nem folheada a ouro -, é legítimo supor que, ao assinarem o documento, os rondonienses estavam pensando no governador Ivo Cassol (afastado do PPS) – de quem não se conhece registro de que tenha ido aos tapas com quem é a favor da idéia. Pois bem. Daqui, chancelaram a proposta os deputados Lindomar Garçon (PV), Ernandes Amorim (PTB) e, pasme o leitor, os petistas Eduardo Valverde e Anselmo de Jesus.
E põe espanto nisso, porquanto se as assinaturas de Garçom e Amorim são perfeitamente justificáveis, posto que notórios e fiéis parceiros do governante local, a atitude de Valverde e Anselmo deixa a todos tanto mais perplexos na medida em que, supondo que a reiterada palavra petista e presidencial tenha algum valor, desagrada a Lula ao contrariá-lo no que é de amplo conhecimento público e mimoseia Cassol, acerca de quem qualquer criança política é capaz de concluir que a possibilidade de disputar um terceiro mandato é, neste momento, tudo que ele poderia esperar da providência divina. Com vários agravantes, como adiante se verá.
Mesmo contra a manifesta discordância de Lula, 34 dos 78 petistas da Câmara assinaram a medida, entre os quais nomes que, tanto quanto o de Valverde no âmbito caripuna, chamam a atenção no contexto nacional - como o do secretário-geral do partido, José Eduardo Cardozo (SP), e o do ex-líder da bancada Luiz Sérgio (RJ).
2 – OPINIÃO PÚBLICA
Dado que o trambelho já começou a tramitar, significa que, independentemente da proclamada contrariedade palaciana, o estorvo pode acabar sendo aprovado pelo parlamento tapuia. Não leitor, daí por diante nem querendo o presidente Lula pode impedir o curso da novidade, porquanto as emendas constitucionais não passam pelo crivo presidencial, restando promulgadas pelo próprio Congresso. Reforçam a crença de que os proponentes não estão para brincadeira as sondagens recentes de opinião pública, indicando que é galopante o crescimento de apoio à proposta. Senão, vejamos.
De acordo com uma destas pesquisas, a do Datafolha divulgada no final do mês passado, a emenda em questão, no caso específico de um terceiro mandato para o presidente Lula, tem hoje apoio de 47%dos entrevistados contra 49% de desaprovação. Mas em novembro de 2007 a proposta era rejeitada por espantosos 65% dos brasileiros e tinha o aval de apenas 31%, números compatíveis, à época, com as respostas sobre um terceiro mandato para governadores e prefeitos. Além do caso exclusivo de Lula, o Datafolha perguntou sobre a hipótese de presidentes concorrerem a um terceiro mandato no Brasil. E aí 49% disseram ser a favor e 48%, contra.
Hoje, um ano e meio depois, esse índice de apoio a um terceiro mandato para presidentes - de 49% - é bem maior do que para governadores (38%) e prefeitos (35%). Para o diretor-geral do Datafolha, Mauro Paulino, os números refletem a popularidade de Lula - também expressa nas intenções de voto. Pois garantido o direito a disputar o terceiro mandato, o petista seria reeleito em primeiro turno se a eleição fosse hoje.
Vale lembrar que proposta que institui o direito a mais uma reeleição no país, da lavra do deputado Jackson Barreto (PMDB-SE), será instituída para valer desde que, depois de promulgada pelo Congresso, seja também aprovada num referendo até o final de setembro. Nesse caso, resta aos proponentes e à base do governo pouco mais de três meses para chegar aos finalmente.
3 – PARA INGLÊS VER
Pelo menos da boca para fora, Lula tem resistido à proposta não só porque fragilizaria a candidatura da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, mas também porque desgastaria sua própria imagem. Para muitos analistas, o indício do desgaste de que se fala está na pesquisa, já que a taxa de aprovação ao governo Lula (69%) é 22 pontos maior que o apoio ao terceiro mandato. Ainda segundo o Datafolha, 37% dos que consideram o governo ótimo/bom se opõem à mudança.
Entre petistas contrários à proposta, vigora a avaliação de que o desgaste seria tanto mais acentuado porquanto, em apenas um ano, Lula seria submetido duas vezes ao voto: agora no plebiscito e na eleição em outubro do ano que vem. Entre os apoiadores da emenda, um dos argumentos é o que relembra que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso conquistou seu segundo mandato em primeiro turno (1998) mesmo com toda a polêmica em torno da aprovação da reeleição. Que não foi pouca, porquanto alimentada por reiteradas e bastante verossímeis denúncias de compra de votos no Congresso. Um horror.
Ademais, segundo o Datafolha, a nova reeleição de Lula tem a simpatia de 53% dos entrevistados com renda familiar mensal inferior a dois salários mínimos. Quer dizer, são as elites que refugam a idéia. Eis que a rejeição à proposta chega a 67% entre aqueles com renda superior a 10 mínimos e enfrenta a resistência de 68% dos com nível superior, tendo apoio de 56% dos que têm nível fundamental. No Nordeste, a emenda tem 60% de apoio. No Sul, é rejeitada por 56%. No Sudeste, 54% reprovam o terceiro mandato e 43%são favoráveis. Nas regiões Norte e Centro-Oeste, a proposta enfrenta rejeição de 51% contra 43% de apoio.
Como se vê, até porque Dilma anda avariada e o futuro a Deus pertence, é factível que Lula esteja jogando para a platéia e, nesse caso, Valverde e Anselmo apenas emulando-o em mais um dos seus brocardos - aquele segundo o qual é melhor prevenir do que remediar. Quanto a Cassol, do jeito que vier é três palitos.