Debate vai lembrar ano mais emblemático do Século XX e ato mais sinistro da ditadura - Por Paulo Queiroz
Foto: Divulgação
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1 – REVISITANDO 1968
Parafraseando o poeta itabirano, nunca nos esqueceremos daqueles acontecimentos na vida de nossas retinas tão fatigadas. Nunca nos esqueceremos que não era apenas uma pedra que tinha no meio do caminho, mas o próprio caminho que, de repente, não mais que de repente, pareceu interditado para toda uma geração – senão para brasileiros de todas as idades que naquele momento engajavam-se na luta para romper a opressão.
O rochedo que desabou no percurso de todos atendia pelo nome de Ato Institucional nº. 5, como se para chancelar a má fama da sinistra conjunção, numa sexta-feira, 13. O mês era dezembro e o ano o de 1968. Dificilmente uma testemunha ocular dessa história terá tido uma intuição mais feliz ao estabelecer que aquele ano simplesmente se esqueceu de acabar, emergindo incessantemente como imagens de caleidoscópio na vida de nossas retinas.
Fala-se, leitor, do jornalista e escritor Zuenir Ventura, que encerrando a temporada local do “Projeto Sempre um Papo”, conforme divulgaram durante toda a semana os responsáveis pela iniciativa em Rondônia, estará nesta terça-feira (16), a partir das 19h30, no auditório do Hotel Vila Rica, para um debate sobre comunicação e literatura com quem interessar possa. No release que se distribuiu, diz-se que o encontro será pontuado principalmente pela investigação que Zuenir realizou sobre a herança do mais polêmico ano do século XX. “Minha preocupação é buscar no mundo de hoje o que nasceu ou se desenvolveu em 1968”.
Pois bem. Dessa preocupação nasceu o livro “1968 – O Que Fizemos de Nós”, cujo lançamento está sendo anunciado para a ocasião. Conforme relato colhido no jornal “Folha de S. Paulo”, com a iniciativa, o jornalista lança uma edição revisada de seu best-seller “1968 - O Ano Que Não Terminou”, que já chegou à marca dos 400 mil exemplares desde que foi publicado em 1988. Este “Que Fizemos de Nós", no entanto, não pretende ocupar a nova data redonda apenas com mais um balanço do que aconteceu há quatro décadas.
2 – TEMPO
Nos primeiros meses desse ano de 1968, no Rio de Janeiro, uma passeata pacífica de estudantes pela reabertura de um restaurante estudantil provocou reação inusitada da polícia militar, resultando na morte do paraense Edison Lima Souto, de 16 anos (apenas um menino, como diria a imprensa). No dia seguinte, 200.000 pessoas compareceram ao enterro e a polícia voltou a atacar, matando mais um, causando 60 feridos e realizando 200 prisões. Na missa de 7º Dia, a cavalaria cercou a igreja da Candelária, confinando os que lá se achavam. Esse confronto se espalhou pelo país e avançou por todo o ano de 68.
Entre vários, dois outros incidentes se destacaram e foram apontados como pretensas razões para o fechamento total do regime. Um, foi o discurso do deputado Márcio Moreira Alves (Marcito), em 2 de setembro, conclamando o povo a não comparecer aos desfiles de 7 de setembro; o outro, o lançamento da canção "Caminhando", de Geraldo Vandré, que os militares consideraram uma afronta às Forças Armadas. Em certo trecho, dizia Vandré: "Há soldados armados, amados ou não;/quase todos perdidos, de armas na mão./Nos quartéis lhes ensinam antigas lições/de morrer pela pátria e viver sem razão.” Havia pretextos suficientes para apertar o torniquete e impedir as manifestações. O governo cuidou, então, de preparar um novo Ato que estabeleceria de vez o poder do estado sobre a nação.
Assim, na tarde/noite da sexta-feira, 13 de dezembro de 1968, sentados à mesa de jantar do Palácio das Laranjeiras, sede da Presidência da República no Rio, 25 membros do Conselho de Segurança Nacional - 15 militares e 10 civis - aprovaram o Ato Institucional nº 5 (AI-5), numa reunião que durou 2 horas e 10 minutos. O ato foi sugerido pelo próprio marechal-presidente Artur da Costa e Silva, sentado à cabeceira, e serviria para legalizar o arbítrio. Só um daqueles 25 homens votou contra, o vice-presidente Pedro Aleixo, embora estivessem na sala outros brasileiros de reconhecida tradição democrática.
3 - TEMPO
Em "1968, o Ano que Não Terminou", Zuenir Ventura descreve como teatro a reunião que aprovou o AI-5: “Pareciam dirigidos pela estética de José Celso Martinez Corrêa... Os atores que comandavam o país representaram todas as alegorias que o tropicalismo havia posto na moda: o Cinismo, a Hipocrisia, o Servilismo, a Pusilanimidade, a Lisonja, a Subserviência”. E diz o livro "1968": - Naquele palco, José Celso teria pouco a acrescentar. Os personagens reais eram suas próprias caricaturas... Um jogo de cinismo que nenhuma transposição dramática conseguiria superar.
Ao rever o primeiro "1968", Zuenir concebeu um segundo em que buscasse, segundo ele, "continuidades e rupturas" entre a quase mítica "geração de 68" e jovens de hoje.
"Não há hoje "a" geração. Há tribos, galeras, turmas. Por isso, achei que a estrutura não devia ter uma ordem rígida. É mais fragmentada", diz ele, aos 76 de idade, referindo-se à primeira metade do livro, em que faz pequenas reportagens para retratar os tempos atuais e pô-los em contraste com 68 -na segunda, entrevista nomes importantes da época falando de ontem e hoje. "Também era assim em 68, mas os jovens eram muito agressivos e respondiam: não confie em ninguém com mais de 30 anos".
O encerramento da temporada porto-velhense de “Sempre um Papo” será marcado também pelo relançamento de outra obra do autor, o livro “Chico Mendes - Crime e Castigo” (Companhia das Letras), que reúne as reportagens escritas por ele a respeito do líder ambientalista assassinado em 1988. O livro é dividido em três partes. A primeira, "O Crime", reúne as reportagens feitas no começo de 1989, logo após o assassinato do seringueiro. Na segunda, "O castigo", estão as matérias produzidas dois anos depois, em 1990, juntamente com Marcelo Auler, durante a segunda e a terceira viagens do jornalista ao Acre, para cobrir o julgamento dos assassinos. A terceira parte contém textos de outubro de 2003, quando Zuenir revisitou lugares e personagens envolvidos no crime.
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