Nós, da Banda Odisséia, fomos acusados recentemente de ter ofendido o povo de Rondônia através de uma de nossas composições, uma releitura do hino do Estado. Na verdade, a letra faz uma atualização histórica do processo de ocupação da região, denunciando injustiças e destruição ambiental, visão esta com a qual qualquer historiador ou cidadão comum de bom-senso concordaria.
Usamos a liberdade de expressão, garantida pelo regime democrático, para denunciar o retrato cruel de um Estado cheio de desigualdades, notoriamente conhecido no país pelos desmandos de sua classe política e por ser um dos maiores destruidores do bioma amazônico.
Em momento algum ofendemos o povo (leia-se abaixo a letra na íntegra), mas sim aqueles que se identificam com os atos por nós denunciados.
A conclusão da música, em especial, clama por mais justiça e melhores dias no futuro. A música, a arte como um todo, é uma forma de compreensão crítica do mundo. Toda verdadeira música é uma "máquina de ajudar a ver". Nesse sentido, não pode se limitar a reproduzir o discurso oficial, defender uma visão que em nada se parece com a realidade. Tal discurso só interessa aos poderosos, aos que lucram com as injustiças e com a destruição em nome do progresso. Não é em nome deles que cantamos.
Sabemos que ouvintes e leitores de senso crítico se identificam com a letra, por mais cruel que seja.
"Azul, poderia ser azul". Que seja. Mas, para isso, devemos enfrentar os fatos, apontar as causas e os efeitos. Se nossa natureza foi guilhotinada, se nosso ar é irrespirável por metade do ano devido às queimadas e somos conhecidos lá fora por chacinas e escândalos políticos, algo precisa ser feito, precisa começar a ser feito. Mesmo que seja por uma simples banda, por uma nota desafinada no meio da multidão.
Novos Céus
Quando começamos a tortura
Para esculhambar a natureza
Nós, os invasores de Rondônia,
Nos afogamos em tanta pobreza.
Somos causadores de queimadas,
Nosso combustível é o dinheiro.
Fim de uma história deprimente:
Nada aos nativos, tudo aos posseiros.
Nessa fronteira abandonada
O povo trabalha até doente.
Muita chacina e pouca esmola,
Corrupção galopa febrilmente.
Atos dementes roubam o futuro
Da juventude dessa nação,
E com coragem nós gritaremos
Enquanto nos arrancam o coração.
Azul, poderia ser azul,
Em vez, tudo cinza tudo igual,
Nosso rio só tem mercúrio,
Amazônia é capim.
Assim, nossa vida é desumana.
Guaporé fundamental,
Reinventa a tua história
Ou será o nosso fim!