Em 12 meses ricos recebem em dinheiros público 10 vezes a ajuda a pobres em 50 anos - Por Paulo Queiroz
Foto: Divulgação
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Política em Três Tempos
1 – SANGUE TUPINAMBÁ
Os caciques ficaram horrorizados com o que viram do outro lado do Atlântico. No que aqui interessa, após conversar com três deles, o filósofo anotou: “Eles manifestaram sua incompreensão e espanto ao notar gente bem alimentada, morando em palácios, gozando a vida, enquanto homens emagrecidos, esfaimados e miseráveis mendigavam à porta dos outros. Os selvagens não entendiam como esses homens podiam suportar tanta miséria e injustiça sem se revoltar, incendiar as casas dos demais e depois torcer-lhes os pescoços".
É essa a herança genética a que se refere o frei. Essa capacidade de se indignar e reagir à altura diante das iniqüidades, vocação proveniente da ascendência nativa originária que o clérigo acredita correr nas veias da brasilidade, embora bastante entorpecida por séculos de cultura colonialista de corte mercantil e consumista. Mas, como fogo de monturo, capaz de irromper em chamas se reiterada e profundamente escavacada. Para o beato, certo noticiário recente, se adequadamente refletido e desvelado, pode terminar por revolver essas cinzas e desencadear a coletiva e justa revolta.
2 – SUOR DOS POBRES
Não, leitor, não são os escândalos do Senado, nem a pizza em que resultou o julgamento do “Deputado do Castelo” na Comissão de Ética da Câmara e nem tampouco a operação abafa conduzida por Luís Inácio para engessar a CPI da Petrobras. Conquanto o conjunto configure uma situação deplorável, tudo isso é perfumaria diante dos conteúdos esgrimidos por Rubempré. Para se ter uma idéia, leitor, o frei disse que recentemente teve ímpetos de rodar a batina e partir para a ignorância diante da notícia segundo a qual, por qualquer ângulo que se observe, os brasileiros mais pobres pagam duas vezes mais impostos do que os seus compatriotas mais ricos. Como é que pode?
Para agravar o que já seria um despautério, no mesmo dia (30.06) em que o Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea) provou isso por “A” mais “B”, Luís Inácio anunciou novas desonerações de impostos para socorrer o setor produtivo (os ricos). Com o suor dos mais pobres que, segundo o Ipea, têm que trabalhar 197 dias do ano para pagar os tributos. Quase o dobro dos 106 dias de esforço exigido dos mais ricos, que ganham acima de 30 salários mínimos.
Pior: o estudo do Ipea mostra que esse desequilíbrio vem aumentando e está longe de ser resolvido. De 2004 para 2008, o comprometimento da renda com o pagamento de tributos dos brasileiros só aumentou mais para os pobres, crescendo a distância que os separa dos mais ricos. Segundo o estudo, a carga tributária representa 22,7% da renda dos 10% mais ricos. Para os 10% mais pobres, no entanto, o peso equivale a 32,8% de sua renda.
A explicação está na forma de cobrança. A base da arrecadação é mais forte na tributação indireta, ou seja, embutida em alimentos ou bens de consumo. Como os mais pobres gastam a maior parte da renda em consumo, pagam mais impostos. Além disso, o imposto embutido no osso da sopa do pobre é igual ao do filé do estrogonofe do rico. Considerando apenas a tributação indireta, a carga dos mais pobres é o triplo da daqueles, de 29,1%, contra 10,7% dos mais ricos.
3 – AJUDA AOS RICOS
Mas o que mais anda revolvendo a bílis do eclesiástico é a descoberta de que é pura lorota, engodo e empulhação essa história de que a bufunfa arrecadada pelo governo com os impostos seria dinheiro público. Que dinheiro público que nada, considerado! Essa cascalheira tem dono e está longe de ser o povo. Para o povo retorna o que sobra – se sobrar e quando retorna -, mas o grosso mesmo fica no andar de cima. Quando não é repassado direta e imediatamente (via superávits primários para pagamentos de juros aos rentistas), fica entesourado para disponibilidade em circunstâncias várias.
Conquanto disso há muito o frei já desconfiasse, a certeza mesmo sobreveio ao ler, na semana passada, a notícia sobre o mais recente relatório divulgado pela Campanha da ONU pelas Metas do Milênio. Instituída pelo órgão em 1960, essa campanha pretendia comprometer os países signatários com um programa cujo objetivo era reduzir pela metade a fome no mundo – que na época afligia cerca de 500 milhões de pessoas. Pois bem.
De acordo com o tal relatório, até hoje, ou seja, em 49 anos de existência, os países comprometidos com a campanha destinaram cerca de US$ 2 trilhões para socorrer os pobres que estão morrendo de fome.
Em compensação, apenas no último ano, ou seja, de meados de 2008 para cá, a grande indústria, os bancos e outras instituições financeiras ameaçadas pela crise receberam US$ 18 trilhões em ajuda pública. Quer dizer, a elite financeira internacional e as mega-corporações industriais transnacionais receberam, no último ano, quase 10 vezes mais dinheiro público em ajuda do que todos os países pobres em meio século.
De onde não se tem dificuldade para concluir que o chamado dinheiro público é, na verdade, um bizarro fundo de pecúlio cujos beneficiários são exclusiva e prioritariamente os ricos. Quanto aos pobres, bem... Segundo a ONU, a alta nos preços dos alimentos levou mais 105 milhões de pessoas à fome nesta primeira metade de 2009, fazendo o total de famintos aumentar para mais de 1 bilhão. “Ah nossa herança tupinambá”, suspira o frei.
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