1 – JÚNIOR NO PSDB
Claro que se sabia que haveria de ser mais do que uma ocasião em que um senador do PR assinaria a ficha de filiação ao PSDB. Mas depois do que aconteceu nesta sexta-feira (25), em Porto Velho, quando meia-dúzia de senadores da República sancionou o lançamento da pré-candidatura de Expedito Júnior ao governo de Rondônia, numa demonstração de prestígio jamais vista nestas margens do Madeira, sobrou muito pouco espaço para o governador Ivo Cassol (PP) insistir com essa munganga de forçar o vice João Cahulla (PPS) a disputar a sucessão sem deixar cair a máscara. Idiossincrasias têm limites. Essa do dirigente rondoniense - de recalcitrar alucinadamente em torno de um projeto que a todos parece insensato – não mais se justifica sem ser confundida com um surto prolongado de puro desvario. Se bem que produto de insidioso cálculo, como adiante se verá.
Aliás, apenas o puxa-saquismo e/ou o medo de melindrar “sua majestade” terá, até agora, impedido os que cercam Cassol de abrir-lhe os olhos para a contrariedade que lhes assalta. Eis que, como chega a ulular, só um capricho da imponderabilidade será capaz de fazer um pangaré vencer uma corrida em que o animal está sendo constrangido a competir entre puros-sangues. João Cahulla pode ser o bicho, mas o que um exame do seu pedigree revela é que ele está longe, mas muito longe mesmo, de poder emparelhar-se aos corcéis que estarão na raia local em 2010. Ainda mais nas circunstâncias sugeridas pela manifestação tucana desta sexta-feira, importando pouco ou quase nada as habilidades do ginete.
Evidente que Cassol também sabe disso. Melhor dizendo, em se tratando de estultices político-eleitorais, poucos há que se lhe possam comparar nesse tipo de conhecimento, porquanto sabe muito mais do que gente de que sequer se desconfia. Mas como vislumbrou a possibilidade de instalar um títere em seu lugar enquanto cumpre a quarentena eleitoral de modo a maximizar suas chances de retornar ao governo em 2014, deu-lhe na telha de inventar a bizarra candidatura Cahulla.
2 – EMINÊNCIAS PARDAS
Terá, obviamente, suas justificativas. Mas pelo que até agora à opinião pública e, principalmente, aos correligionários foi dado ver, estas razões parecem ser tão suas e, na sua quase totalidade, servir tão somente aos seus interesses que o próprio Cassol ainda não conseguiu construir um discurso capaz de fundamentar a motivação que poderia levar o seu grupo ao entusiasmo por essa escolha e o eleitor a confiar os destinos seu e do Estado a João Cahulla. Ou seja, até onde a vista alcança, a razão maior que poderá levar o eleitor a sufragar Cahulla para governador - tanto quando o fez para que ele fosse o vice - permanece enfeixada tão somente na vontade de Cassol.
Pode dar certo? Nada obsta. A crônica da política brasileira é pontuada de lideranças políticas singularmente poderosas e centralizadoras que fizeram de eminências pardas algo que se pudesse enxergar no plano maior. Foi assim que Antônio Carlos Magalhães fez João Durval governador da Bahia, Orestes Quércia idem com Antônio Fleury em São Paulo, Paulo Maluf elegeu Celso Pita prefeito paulistano e por aí vai.
Até porque a estratégia envolve riscos bastante elevados, não se tem notícia de grupos que a tenham enfrentado convivendo com divisões internas, porquanto o que está em jogo é a própria sobrevivência dos grupos. Na pior das hipóteses – que nesses casos é, pela lógica, a mais provável -, perde-se a cabeça da chapa, mas a união melhora as chances de bons desempenhos do pescoço para baixo. Vão-se os anéis, salvam-se muitos dedos.
Seja porque estava escrito nas estrelas (fortuna), seja porque o trabalho persistente termina sempre por fazer emergir o resultado perseguido (virtu), havia um Expedito Júnior no meio do caminho de Cassol. Mas não é razoável imaginar que o governador não soubesse desde sempre que tinha (tem) ao seu lado um Júnior que se preparou a vida inteira para tentar escalar o Palácio Presidente Vargas na primeira oportunidade em que vislumbrasse a chance de fazê-lo com riscos aceitáveis.
3 – OPÇÕES DE CASSOL
Como incurável egocêntrico que é, porém, Cassol deu uma de João sem braço e inventou a via Cahulla. Se colar, colou. E por absoluta falta de outra possibilidade, vinha colando sem óbices até esta sexta-feira, quando o ato a filiação de Júnior ao PSDB assumiu, de fato, os contornos inconfundíveis de lançamento de pré-candidatura ao governo. Com tudo que isto possa implicar, aí incluídos a desmoralização e os prejuízos políticos irreparáveis que um recuo significará. Caso em que Júnior restará inservível até para o próprio Cassol - que está se lixando para o fenômeno em si.
Mas como está longe de atirar pedras na lua, não pode se lixar para o fato de que, como a pré-candidatura existe, terá que se posicionar. Ou mantém o grupo unido em torno de Expedito Júnior ou insiste na via Cahulla e encara 2010, na melhor das hipóteses, com dois palanques, mas ainda tentando manter, em tese, a identidade de grupo. Para inglês ver, naturalmente.
A começar por ele próprio, a ninguém é dado ignorar que o calor da disputa terminará por expor antagonismos, evidenciando um racha. Pior: nessa hipótese, só um milagre salvará a via Cahulla e a alternativa Júnior, a depender do quanto Cassol trabalhará contra, terá drasticamente reduzidas as possibilidades de chegar a um eventual 2º turno. E em caso de uma dupla derrota, em vez de racha, do grupo restará apenas os cacos.
Não por acaso quem mais torceu pela filiação de Júnior ao PSDB e está rezando pela consolidação da pré-candidatura são os anti-governistas PT, PMDB e quejandos. Sabe-se como funciona a cabeça de Cassol. É perfeitamente possível que, para ele, seja preferível a derrota dos dois grupos à vitória de Júnior. Quer dizer, melhor a possibilidade de juntar os cacos em 2014 do que tentar retornar ao governo com Júnior trabalhando pela reeleição. Não será, pois, surpresa alguma a manutenção do projeto Cahulla. Mas aí ficará claro que, se os anéis podem ir às favas, os dedos que Cassol tentará salvar serão sempre e apenas os dele mesmo. Eureka!