O Japu, uma ave de cor preta com bico e cauda amarelos que habita grande parte das florestas da América do Sul, tem utilizado novos materiais para construir seus ninhos: resíduos plásticos.
Uma pesquisa ainda não publicada da Universidade Federal do Pará (UFPA) revela que, na região, 66,6% dos ninhos dessa espécie contêm fibras e cordas plásticas.
No entanto, esse é apenas um dos muitos problemas causados pelo descarte inadequado de plásticos na fauna amazônica. Esse material sintético já se espalhou por todo o bioma em diferentes escalas.
Segundo José Eduardo Martinelli Filho, professor da UFPA, estima-se que 182 mil toneladas de plástico sejam despejadas anualmente nas águas da Amazônia brasileira, tornando-a a segunda bacia hidrográfica mais poluída do mundo.
Além do plástico descartado nas cidades em crescimento na Amazônia, o bioma também recebe resíduos de países a montante como Colômbia e Peru.
“Frequentemente, vemos estudos científicos mostrando peixes ingerindo microplásticos. Mas, em qualquer lugar da biota que se procure plástico, em diferentes tamanhos, é possível encontrar esses poluentes”, comentou o professor à revista Fapesp.
Outro estudo recente da UFPA identificou a retenção de microplásticos por plantas macrófitas aquáticas no Rio Amazonas.
Essas plantas, que servem de alimento para várias espécies, acabam transferindo microplásticos ao longo da cadeia alimentar, contaminando diferentes animais, além da ingestão direta das micropartículas presentes na água.
A questão do plástico e microplásticos nas águas brasileiras foi debatida na 76ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), realizada esta semana em Belém, Pará.
Pesquisadores presentes destacaram que, na Amazônia, o problema do descarte inadequado de plásticos é agravado pelo saneamento precário, pelas vastas dimensões da região e pela falta de estudos específicos.
De acordo com dados apresentados por Martinelli Filho, 70% das cidades da Amazônia brasileira não possuem tratamento de água e apenas 2,6% dos municípios têm saneamento básico adequado.
“É raro encontrar situações de saneamento adequado na Amazônia. Em Altamira, no Pará, por exemplo, há apenas uma estação de tratamento de água, que não consegue processar todo o esgoto produzido pela cidade”, observou Martinelli.
A pesquisa limitada, a escassez de recursos, as restrições metodológicas e a falta de padronização, aliadas às dimensões continentais da Amazônia, dificultam a obtenção do conhecimento fundamental necessário para avaliar com precisão os impactos e implementar medidas de mitigação eficazes.