A popularização de investimentos na Bolsa de Valores, em fundos de renda fixa e em criptomoedas deu munição para que golpistas de todo o país aumentassem seu poder de persuasão
Foto: Divulgação
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As características são sempre as mesmas. Milhares de pessoas atraídas por promessas de rendimento rápido dos seus investimentos e pela possibilidade de ter uma vida de luxo. A popularização de investimentos na Bolsa de Valores, em fundos de renda fixa e em criptomoedas deu munição para que golpistas de todo o país aumentassem seu poder de persuasão.
Até outubro deste ano, a Unidade de Inteligência Financeira (UIF), ligada ao Ministério da Economia, registrou 11 casos suspeitos de esquema de pirâmide financeira. No ano passado, foram 10. Em 2017, ao todo, foram 12 e, em 2016, apenas 5, o que revela uma atividade ilegal em ascensão.
Uma empresa com sede em Taguatinga, no Distrito Federal, com 10 mil clientes cadastrados, está na mira das autoridades, que suspeitam de envolvimento com essa atividade ilícita.
Este ano, a Comissão de Valores Mobiliários, entidade responsável pela fiscalização do mercado financeiro, vai bater recorde de multas aplicadas contra fraudes, o que inclui pirâmide, concorrência desleal, lavagem de dinheiro, entre outros. Somente até o segundo trimestre deste ano, foram aplicados R$ 770 milhões em multas, mais que o dobro dos R$ 350 milhões de todo o ano passado.
Na modalidade de pirâmide, as vítimas aplicam recursos e são convencidas a levar mais pessoas para o “negócio”. A promessa é de que, com a entrada de mais clientes, o “associado” recebe uma comissão por quem ele indicou, e assim, quanto mais gente ele convencer a aderir ao programa, mais dinheiro cairá na sua conta.
O “investidor” até chega a receber algumas parcelas, como forma de mascarar o esquema. No entanto, logo o negócio perde sustentação e apenas quem está no topo da pirâmide, ou seja, os fundadores, adquirem um patrimônio milionário. O primeiro sinal do golpe é o fato de a empresa se preocupar mais em atrair novos integrantes para o sistema financeiro de fachada do que elevar a qualidade de seus produtos.
É comum que a venda de algum tipo de serviço ou produto seja oferecido para dificultar o trabalho das autoridades e enganar mais pessoas.
Há pouco mais de um mês, a Polícia Federal deflagrou uma operação contra a companhia gaúcha Unick Forex, acusada de montar um esquema de pirâmide, e que era investigada por atuar no mercado financeiro sem autorização das autoridades competentes, com a captação ilegal de recursos de cerca de 1 milhão de clientes.
O inquérito policial foi instaurado em janeiro deste ano e apurou que os clientes do grupo eram atraídos pela promessa de retorno de 100% sobre o valor investido, no prazo de seis meses, ou um retorno de até 3% ao dia. Com o apoio da Receita Federal, a corporação identificou captações que chegaram a R$ 40 milhões por dia desde 2017 pela Unick, que usava as redes sociais e aplicativos como o WhatsApp para enviar vídeos e ofertas.
A estimativa da Polícia Federal é que as captações da Unick chegaram a R$ 2,4 bilhões. Ficou constatado durante as investigações que a empresa cometeu, além da captação irregular de poupança popular, evasão de divisas e lavagem de dinheiro. O grupo tinha um escritório no paraíso fiscal de Belize e planos de expansão para o exterior.
O dinheiro dos investidores era aplicado no chamado mercado de Foreign Exchange (Forex), de compra e venda de moedas, operações somente autorizadas às instituições financeiras oficiais — hoje, não há instituição brasileira autorizada a atuar em Forex.
Kriptacoin
Em Brasília, um dos casos mais emblemáticos de pirâmide financeira culminou na condenação de 13 pessoas por crime contra a economia popular, ocultação de bens, falsidade ideológica, organização criminosa e lavagem de dinheiro. O grupo Wall Street Corporate, que iniciou as operações em 2017, induzia as vítimas a aplicar dinheiro em uma moeda virtual falsa, intitulada Kriptacoin, com a promessa de 1% de lucro ao dia.
Os envolvidos ostentavam uma vida de luxo nas redes sociais e transitavam pela cidade em veículos importados, com o objetivo de atrair novos clientes. A estimativa é de que mais de 40 mil investidores foram prejudicados e os criminosos tenham lucrado aproximadamente R$ 250 milhões em seis meses de atuação. A Kriptacoin chegou a inaugurar uma sede em Vicente Pires-DF.
Parte do dinheiro arrecadado era direcionado para pagar os investidores, mas, como os rendimentos eram prometidos apenas após um ano, os clientes não receberam nenhum retorno. A maioria dos recursos, na verdade, era utilizada pelos líderes e subordinados do esquema, como para a compra de bens de luxo em nome de laranjas.
A organização criminosa foi desmontada em outubro de 2017 pela Polícia Civil de Brasília. Grande parte das pessoas só descobrem que foram enganadas quando não conseguem mais contato com a empresa para retirar o dinheiro que haviam aplicado. Nestes casos, mesmo com o esquema sendo desbaratado, as autoridades podem ter dificuldades em localizar onde está o dinheiro. O prejuízo das vítimas pode nunca ser recuperado, mesmo com a prisão dos organizadores do esquema.
Investigação em Taguatinga
As autoridades do Distrito Federal concentram esforços, há alguns meses, para apurar denúncias de um suposto esquema de pirâmide financeira que está em crescimento na capital do país. A empresa G44 Brasil, que mantém escritório em Taguatinga, atrai interessados em investir no mercado financeiro desde 2017.
Em dois anos, o crescimento rápido do negócio chamou a atenção do Ministério Público do Distrito Federal (MPDFT) e da Coordenação de Repressão aos Crimes Contra o Consumidor, à Ordem Tributária e a Fraudes da Polícia Civil do DF (Corf). O Ministério Público confirma que investiga o caso e que as diligências são conduzidas pela Polícia Civil.
Em seu site, a empresa afirma que oferece um pacote de investimentos em criptomoedas. Além disso, de acordo com fontes envolvidas, a companhia promete uma comissão para quem atrair novas pessoas para o negócio. No entanto, no ano passado, a Comissão de Valores Imobiliários (CVM) emitiu um alerta ao público de que a empresa estava operando de forma irregular no Brasil.
De acordo com o comunicado da CVM, “foram apurados indícios de que a G44 Brasil Intermediações Financeiras Eireli, da sócia Joselita de Brito De Escobar e seu preposto Saleem Ahmed Zaheer (fundador) captavam clientes irregularmente, por meio do site www.g44.com.br, para realização de operações no mercado de valores mobiliários”.
A entidade informou que a empresa não tem autorização para a captação de clientes em território nacional. A CVM assegura que a medida ainda está em vigor e que a G44 foi multada por descumprir a decisão. O processo contra a empresa ainda está aberto.
Além de operar com criptomoedas, a empresa atua no setor de minério, o que, de acordo com a G44, seria uma forma de “garantir uma carteira de investimentos mais segura e diversificada”. No entanto, a empresa está com dificuldade de pagar os cerca de 10 mil associados, com atrasos recorrentes e limitação do valor de saque para quem tenta retirar o dinheiro. A empresa nega atuar irregularmente.
Cuidados
No site Reclame Aqui, especializado em direito do consumidor, diversos clientes reclamam que não conseguiram sacar o dinheiro que foi aplicado em investimentos por meio da empresa. Uma denúncia revela que parte da equipe da G44 seria a mesma que pertencia à Kriptacoin, sistema desbaratado pela Polícia Civil há dois anos.
Para entrar no negócio, o investidor aplica um valor, parte fica com a companhia e o restante, rendendo no mercado. Seria oferecida comissão a cada nova indicação feita por quem já faz parte da carteira de associados da empresa.
Para evitar fraudes, há algumas recomendações que podem ser seguidas. Membro da Comissão de Defesa da Concorrência da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o advogado Leandro Cunha sugere que, antes de aceitar qualquer proposta, a pessoa convidada a integrar a empresa faça uma ampla pesquisa sobre a instituição, principalmente de como funciona a sua estrutura jurídica.
“O primeiro passo é a informação. Qualquer empresa com credibilidade terá uma posição institucional, ou seja, uma pessoa jurídica e empresários gestores”, explica.
Além disso, Cunha recomenda que sejam feitas consultas do CNPJ e do nome da empresa na internet, o que pode revelar aspectos importantes sobre sua reputação.
“Todo tipo de negócio oferecido de forma coletiva deve ter um conjunto robusto de informações para os futuros entrantes. Algo que só fale sobre os resultados e as coisas certas, e que não alerte sobre os riscos, é motivo para desconfiança”, diz.
Para o advogado, os interessados devem se preocupar com a forma que a empresa divulga o seu produto e de como garante que os lucros serão acima do normal.
“Nas pirâmides financeiras, a oferta é feita de uma maneira intimidatória, e a pessoa acaba sendo taxada de inconsequente por não entrar em uma operação que promete alta rentabilidade. Mas, em qualquer tipo de investimento, não há nenhuma garantia de retorno. Assim que você ingressa em um esquema desses, você assume um risco empresarial. O negócio pode dar certo ou não”, alerta.
Segundo Cunha, a promessa de uma vida de luxo após a promoção a determinado nível da pirâmide, com constantes viagens a locais paradisíacos, por exemplo, é outro sinal de alerta. “Qualquer tipo de investimento que garanta ganhos acima do normal tem de ser avaliado com muito cuidado. As pessoas devem estar conscientes de que, se o retorno prometido é alto, o risco também é proporcionalmente maior,” completa o especialista.
G44 nega esquema irregular
A G44 Brasil se defende, alegando não ser um esquema de pirâmide financeira, e argumenta que os atrasos nos pagamentos dos sócios são decorrentes do crescimento acelerado das operações. Em nota, o grupo também diz não ser regulado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
“O Grupo G44 possibilita a entrada de sócios em seu quadro por meio de Contratos de Sociedade em Conta de Participação – SCP, regulado exclusivamente pelo Código Civil Brasileiro em seus artigos 991 a 996, não estando na esfera de regulação da CVM. Ou seja, as pessoas, quando assinam um contrato, não estão investindo dinheiro em um mercado de ações ou capital, nem entrando em esquemas de rendimento, como pirâmides. Se tornam sócios da G44 Brasil e recebem participação nos lucros da empresa, conforme seu crescimento e ascensão”, declara.
Plataforma digital
Além disso, a G44 disse que faz a gestão de outras empresas e atua de forma legal no Brasil. “A G44 Brasil S.A é uma holding que faz a gestão de negócios como exchange de criptomoedas, mineração de esmeraldas, mineração de ouro, lapidação de pedras preciosas, fabricação e venda de joias e construção civil.
O trabalho que desenvolvemos com criptomoedas é uma plataforma digital de compra e venda de Bitcoins. A atividade é regular no Brasil”, argumenta.
Com relação aos atrasos nos pagamentos, a G44 alega que sua atividade “cresceu em ritmo acelerado” e que seus limites bancários se tornaram pequenos para a quantidade de transações realizadas.
“Essas mudanças provocaram sensíveis desconfortos em nossos sócios, pois tivemos que tornar manual nossas operações enquanto nosso sistema estava sendo otimizado, e isso realmente gerou alguns atrasos de pagamentos. Mas todas as pessoas receberam e estão recebendo seus dividendos, ainda que com algum atraso. Estamos trabalhando arduamente para solucionar todos os casos e estamos tão empenhados em explicar o ocorrido aos nossos sócios que nossos canais de atendimentos estão congestionados”, completa a empresa em nota.
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