Falo não apenas como policial militar com mais de dez anos de atuação nas ruas de Porto Velho, mas também como cidadão brasileiro que observa, dia após dia, a realidade nua e crua da nossa juventude. Em uma década de serviço ostensivo, vi de tudo que se pode imaginar: o sofrimento de famílias, a ruína de jovens, e o preço alto que a ilusão do crime cobra. Mas falo, sobretudo, com a consciência de quem também veio de baixo, de família simples, e escolheu o caminho do estudo e da disciplina para construir a própria vida.
Há um discurso recorrente nas bocas de muitos: “o jovem está no crime por falta de oportunidade”.
Essa frase soa bonita nos debates e nas redes sociais, mas não resiste a quem conhece o asfalto.
O que vejo nas madrugadas da Zona Leste é outro retrato. Passe de madrugada em frente às boates da região — o Boteco 99, a Royal, e tantas outras — e observe: os mesmos jovens que dizem não ter oportunidade estão ali, virando a noite no tráfico, na droga, na ostentação e, muitas vezes, em crimes ainda mais graves, como o estupro de vulnerável. Eles têm energia para passar a madrugada inteira no vício e na ilusão, mas não têm disposição para passar uma noite acordados estudando, se preparando, construindo o próprio futuro.
Não falta acesso. Hoje, qualquer celular tem internet. Há Wi-Fi em cada esquina, vídeos gratuitos de aulas, programas como Pé-de-Meia, Prouni, FIES, escolas em tempo integral, cursos técnicos, bolsas e até universidades públicas. O que falta é vontade. O Estado tem o dever de oferecer oportunidade, mas não de carregar o indivíduo pela mão. É dever do cidadão assumir responsabilidade sobre o próprio caminho.
Quando eu tinha 16 anos, estudava com apostilas antigas, internet discada e sem luxo nenhum.
Com 18, já havia passado na PM e na Polícia Civil de Rondônia. Não porque era fácil, mas porque eu quis. Eu não saía pra “ser besta na rua”. Eu tinha um propósito. Essa é a diferença: enquanto alguns madrugam se destruindo, outros madrugam construindo.
A realidade que vejo é que muitos desses jovens não rejeitam autoridade — eles apenas rejeitam a autoridade legítima. Aceitam hierarquia, obediência e disciplina dentro da facção, mas não suportam a mesma disciplina na escola, na família ou no quartel. E isso não é pobreza — é desvio de valor. É mais confortável culpar o “sistema” do que olhar no espelho e admitir que o crime foi escolha.
As grandes empresas têm medo, e com razão, de empregar quem tem ficha criminal extensa. O jovem que saiu do fechado com 25 ou 30 anos, sem estudo e sem qualificação, percebe tarde demais que o tempo passou. A ficha pesa, o arrependimento chega — mas o futuro não espera.
Como policial, vejo diariamente a diferença entre quem quer e quem desiste. O crime não é reflexo inevitável da sociedade: é a soma de decisões erradas, muitas vezes conscientes, de quem preferiu o prazer momentâneo à dignidade duradoura. O Estado precisa continuar oferecendo caminhos, sim — mas a responsabilidade de caminhar é de cada um.
O crime é escolha. E a escolha tem preço.