CONCLAVE: Segredos obscuros, disputas políticas e vaidades na escolha do papa - Por Marcos Souza

CONCLAVE: Segredos obscuros, disputas políticas e vaidades na escolha do papa - Por Marcos Souza

Foto: Divulgação

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Com a morte do Papa Francisco, cujo nome de batismo era Jorge Mario Bergoglio, o mundo inteiro se volta aos ritos do conclave — momento em que os cardeais com menos de 80 anos, representando diversos países, votam e escolhem o novo papa. Trata-se de um processo lento, solene e muito aguardado pelos fiéis católicos. Mas o que acontece nos bastidores dessa escolha? Como, de fato, ela é realizada? Quais ritos e interesses da Igreja Católica estão envolvidos na eleição? 
 
O filme Conclave (2024), uma produção caprichada dirigida pelo excelente cineasta alemão Edward Berger — o mesmo responsável pelo impactante Nada de Novo no Front (2022), vencedor do Oscar de Melhor Filme Internacional — está entre os títulos mais assistidos na plataforma de streaming Prime Video. 
 
 
Conclave retrata, de forma minuciosa, como é conduzida a votação entre os cardeais selecionados de vários países, misturando ficção e realidade no processo eleitoral. O longa aborda o embate entre ideologias progressistas e conservadoras, revelando como essas disputas se manifestam nas entrelinhas — tanto no campo político quanto no da fé —, com interesses por mudanças significativas nos rumos que a Igreja pode seguir. 
 
Baseado no livro de Robert Harris, Conclave recebeu o Oscar de Melhor Roteiro Adaptado. Ao mesclar os ritos litúrgicos tradicionais com revelações de segredos entre os candidatos — que podem influenciar diretamente o resultado —, o filme também adentra uma trama palaciana ambientada na Capela Sistina, no Vaticano, local onde os cardeais se reúnem para votar. O suspense criado pelo diretor mantém o espectador atento, acompanhando voto a voto, numa atmosfera tensa, quem será o novo papa — cada cardeal movido por ambição, fé e vaidade. 
 
O Cardeal Lawrence (em mais um excelente trabalho de Ralph Fiennes) lidera o conclave e é o responsável por conduzir, com rigor, todo o rito da votação, acompanhando os cardeais e candidatos — ele próprio sendo um dos nomes cotados, mesmo contra sua vontade. No entanto, logo ele descobre segredos envolvendo cardeais próximos ao falecido papa, além de uma trama paralela que pode comprometer a eleição do principal favorito: um conservador africano que se opõe ao rumo progressista adotado pela Igreja nos últimos anos. 
 
Ele descobre que um dos candidatos favoritos, o Cardeal Tremblay (vivido pelo ótimo John Lithgow), que foi secretário-geral do papa, esconde um segredo que pode até mesmo desestruturar a eleição. Cabe então a Lawrence conduzir uma investigação sigilosa — mesmo após inicialmente se recusar a fazê-la — para tentar descobrir a verdade antes que o novo papa seja escolhido. 
 
Enquanto isso, um novo nome surge entre os candidatos: o Cardeal Benítez, um mexicano que, após sobreviver a uma doença grave, é enviado ao Afeganistão, onde assume a missão de representar a Igreja Católica em Cabul. Sua entrada no pleito ocorre de última hora, graças a uma indicação póstuma do próprio falecido papa, registrada por escrito sob o designativo “in pectore”. 
 
Essa mudança, no entanto, não causa grande impacto entre os cardeais, que aceitam Benítez com certa frieza. Outros candidatos se mostram mais influentes, como o ultraconservador italiano Tedesco (Sergio Castellitto), que confronta diretamente o progressista Cardeal Bellini (Stanley Tucci), o preferido de Lawrence. 
 
Quando o cardeal africano Adeyemi (Lucian Msamati) se envolve de maneira suspeita com uma das freiras convocadas para servir os cardeais durante o processo, Lawrence acaba descobrindo um segredo que leva a outro — revelações que podem abalar profundamente o conclave e reforçam sua determinação de impedir a eleição de um papa ultraconservador. 
 
À medida que Lawrence tenta desvendar os enigmas que surgem em meio à votação, o conclave se vê sob uma pressão imensa: o novo papa precisa ser escolhido com urgência. No entanto, diante das tensões e revelações inesperadas, a eleição toma um rumo surpreendente, culminando numa reviravolta que parece ser a decisão mais acertada — ou, ao menos, a mais coerente com os tempos atuais. 
 
Mas o verdadeiro plot twist é guardado para o final, em uma sequência ousada e certamente polêmica. O maior segredo de todos é finalmente revelado a um único homem. 
 
Conclave é um belo filme, com produção impecável, fotografia excepcional e montagem precisa. O diretor Edward Berger demonstra mais uma vez ser um verdadeiro estilista da narrativa visual, utilizando longas tomadas criativas e expressivas. O design de produção é fantástico — desde os cenários (com uma impressionante recriação do interior da Capela Sistina), até os figurinos e a direção de arte. Tudo funciona em harmonia para dar um suporte realista e envolvente à trama. 
 
Vale alguns esclarecimentos para entender melhor como funciona, de fato, o conclave retratado no filme — um processo que é, sim, bastante próximo da realidade. 
 
Durante a escolha do novo papa, os cardeais são reunidos na Capela Sistina, onde ficam completamente isolados de qualquer comunicação externa. Nesse período, é proibido o uso de celulares, televisão, jornais ou qualquer forma de contato com o mundo exterior. Eles dormem e se alimentam em acomodações exclusivas, dentro da chamada Domus Sanctae Marthae, uma espécie de residência dentro do Vaticano. Todos os rituais e cerimônias são conduzidos em italiano ou latim. 
 
O termo "conclave" vem do latim cum clavis, que significa “fechado à chave” — uma referência direta ao isolamento imposto aos cardeais. O filme mostra com fidelidade os detalhes desse processo: desde o anúncio da morte do pontífice, passando pela quebra simbólica do anel do papa (o Anel do Pescador), até o lacre de seus aposentos. 
 
Todo o processo que se passa na chamada “zona de conclave” é feito sob absoluto segredo. Os cardeais fazem um juramento solene de sigilo e comprometimento com o rito. Para que um novo papa seja eleito, é necessário que um candidato alcance dois terços dos votos. As cédulas são secretas e, após cada votação, são queimadas. 
 
Oficialmente, são permitidas até quatro votações por dia — duas pela manhã e duas à tarde. Caso, após três dias, não haja consenso e a fumaça continue preta (sinal de que ainda não há papa), é feita uma pausa de 24 horas dedicada à oração e reflexão. Outra pausa pode ocorrer após sete votações consecutivas sem resultado. Em uma situação rara, após 34 votações sem consenso, é promovida uma rodada final entre os dois mais votados. O que alcançar dois terços dos votos é finalmente eleito. A eleição é anunciada pela fumaça branca na chaminé da Capela Sistina, sinal que emociona fiéis ao redor do mundo. 
 
Outros filmes sobre o tema 
 
Dois Papas (The Two Popes, 2019), do cineasta brasileiro Fernando Meirelles (Cidade de Deus), é um filme notável sobre os bastidores do Vaticano. Com roteiro do neozelandês Anthony McCarten (autor também de A Teoria de Tudo e O Destino de uma Nação), baseado em sua própria peça teatral, o filme dramatiza os encontros entre o Papa Bento XVI (interpretado magistralmente por Anthony Hopkins) e o cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio (vivido pelo excelente Jonathan Pryce), então arcebispo de Buenos Aires e futuro Papa Francisco. 
 
 
A narrativa gira em torno dos intensos diálogos entre os dois, refletindo sobre os rumos da Igreja Católica, os conflitos entre conservadorismo e abertura progressista, e os escândalos envolvendo membros do clero. Embora parcialmente baseado em fatos reais, o filme se destaca por trazer à tona dilemas éticos e espirituais profundos, culminando na renúncia histórica de Bento XVI e na ascensão de Francisco ao papado. 
 
Esse filme é muito bem produzido e mostra de forma clara como funciona o conclave e todos os ritos envolvidos — da morte do pontífice até a escolha do novo papa. Porém, o que realmente se destaca é a direção de Fernando Meirelles, que é sensacional: ele utiliza muitos closes expressivos, uma edição precisa, fotografia esmerada e um design de produção excepcional. Dois Papas é, sem dúvida, um dos melhores filmes produzidos pela Netflix e está disponível na plataforma até hoje. 
 
Outra obra que merece ser lembrada é Sandálias do Pescador (The Shoes of the Fisherman, 1968), baseado no famoso livro de Morris West. Produzido e dirigido pelo ótimo diretor Michael Anderson, esse foi o primeiro filme a mostrar os ritos secretos do conclave dentro da Capela Sistina — ainda que de forma ficcional — após a morte do papa Pio XIII (personagem fictício), retratando a eleição de um novo pontífice. 
 
A história, ousada para a época, aborda temas complexos e relevantes no contexto da Guerra Fria, nos anos 60. Numa acirrada disputa entre cardeais para assumir o papado, o Vaticano acaba elegendo uma figura inesperada: o bispo Kiril Lakota (interpretado pelo sempre excelente Anthony Quinn), de origem russa — embora no livro ele seja ucraniano. Lakota havia passado 20 anos preso na Sibéria por defender minorias e se engajar politicamente. Essa trajetória o transforma em uma autoridade moral respeitada, o que o leva a ser escolhido como o novo líder da Igreja Católica. 
 
Ao assumir o papado, ele se vê obrigado a intervir numa grave crise política entre China, Rússia e os Estados Unidos — um reflexo direto da tensão imposta pela Guerra Fria — levando o mundo à beira de uma terceira guerra mundial. O filme mostra como a Igreja Católica tenta assumir o papel de conciliadora, mas se vê colocada à prova diante de pressões políticas e conspirações globais. 
 
Infelizmente, esse filme raro não está disponível em nenhuma plataforma de streaming, mas pode ser assistido em partes no YouTube — uma belo filme escondido que merece ser redescoberto. 
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