Semana Santa

Passei toda a infância com minha família. Grande, muitas tias e tios, primos e primas, irmãos e amigos.

Semana Santa

Foto: Divulgação

Receba todas as notícias gratuitamente no WhatsApp do Rondoniaovivo.com.​

Não me lembro quando foi a última vez que passei a Semana Santa todinha dentro de casa, sem trabalhar. Pensando, refletindo, família em volta. Acho que foi ainda na infância. E agora, por estar me recuperando de uma cirurgia nos olhos. Quieto, tomando remédio. Lendo com dificuldades, adivinhando as letras, escrevendo, ouvindo música. E lembrando.

Passei toda a infância com minha família. Grande, muitas tias e tios, primos e primas, irmãos e amigos. Casa cheia. Muito trabalho, escola e brincadeiras. O dia começava cedo. Às cinco da manhã a mamãe ou a vovó batia no punho da rede: levanta, vai pilar o arroz. Fazer fubá pro cuscuz.

Noutro dia a ordem era diferente: cuida meu filho, o DomDim – meu primo - já está no pilão te esperando para fazer a paçoca de carne. Era moer na mão de pilão a carne assada na brasa, desfiada, misturada com farinha seca(branca) de mandioca. Pilar até virar paçoca. Uma delícia.

O cheiro bom que brotava do pilão, botava a preguiça pra correr. E era muita paçoca, pois além da família, tinha os tropeiros e viajantes que se hospedavam na casa do meu avô Abdon. Enquanto a vó Salomé e a minha mãe Zuleide cuidavam do café da manhã, eles dobravam cuidadosamente as redes de varandas coloridas. Pegavam os animais no pasto, botavam as cangalhas e penduravam as mercadorias em dezenas de animais.

Na grande mesa no meio do salão, cercada de bancos de madeira lavrada, inteiriça, sentavam para comer a fartura de carne assada na brasa, mal assado(um bifão alto semicru) sangrando, paçoca de carne seca, cuscuz de arroz e de milho, queijo, beijus de macaxeira, coalhada, leite, café e cestos de pães fofos e cheirosos. Uma festa pros olhos e pro estômago.

No final da tarde voltávamos para o pilão. Agora, para descascar o arroz do dia seguinte. Ou moer o café torrado na enorme panela de ferro, de onde saia em formato de beiju preto e grudento. Sob as batidas da mão de pilão, virava pó, pronto para o coador de pano. E para espalhar seu perfume estimulando goladas quentes, queimando a língua e o céu da boca.

As vezes, éramos três ou quatro no pilão. Nestas ocasiões a brincadeira rolava solta. Fazíamos uma percussão de muitos ritmos. Batíamos a mão de pilão no fundo e dávamos uma volta na boca do pilão, roçando madeira com madeira. Tudo antes do outro baixar a sua mão de pilão e fazer a mesma coisa. Se atrasasse, levava pancada nos dedos. Ninguém esperava o outro concluir a coreografia.

Noutras ocasiões a habilidade era demonstrada batendo o produto no fundo, e em cada lateral, em cruz. Tam...tantam, tantam, tantam, tantam. O difícil e o gostoso, era quando tínhamos quatro mãos de pilão. Negócio de doido, frenético, perigoso. Mas riamos muito e o trabalho virava brincadeira. O som dos tantans era gostoso de ouvir. Era música. Diversão.

E na semana caçadeira? A que antecede a Semana Santa? Todo esse trabalho era dobrado. tínhamos que juntar, produzir, fazer tudo que iríamos necessitar na Semana Santa. Nela, sagrada, só o trabalho da cozinha era permitido. Não se trabalhava, não se fazia negócios, não se comprava e nem vendia. Não se bebia álcool. Não se discutia, não se brigava nem batia nas crianças. Só se ouvia música clássica ou sacra. Era a semana do Senhor. Meu avô cantava: “Foi na cruz, foi na cruz, que um dia eu vi, meus pecados castigados em Jesus...”

Direito ao esquecimento

A política de comentários em notícias do site da Rondoniaovivo.com valoriza os assinantes do jornal, que podem fazer comentários sobre todos os temas em todos os links.

Caso você já seja nosso assinante Clique aqui para fazer o login, para que você possa comentar em qualquer conteúdo. Se ainda não é nosso assinante Clique aqui e faça sua assinatura agora!

Na sua opinião, qual companhia aérea que atende Rondônia presta o pior serviço?
Você ainda lê jornal impresso?

* O resultado da enquete não tem caráter científico, é apenas uma pesquisa de opinião pública!

MAIS NOTÍCIAS

Por Editoria

PRIMEIRA PÁGINA

CLASSIFICADOS veja mais

EMPREGOS

PUBLICAÇÕES LEGAIS

DESTAQUES EMPRESARIAIS

EVENTOS