Amazonas - FMT/AM avança nas pesquisas e monta laboratório para estudar hanseníase e leishmaniose
A Fundação de Medicina Tropical (FMT/AM) está a um passo de um avanço significativo nas pesquisas voltadas para doenças infecciosas como hanseníase, leishmaniose e malária. Até o final deste ano, deverá ser inaugurado o Laboratório de Pesquisas Multidisciplinar de Doenças Endêmicas Infecciosas, cuja linha de estudo é a biologia molecular. Entre outros avanços, a novidade pode significar desde a descoberta de tratamentos preventivos mais eficientes para estas doenças até abrir caminho para o surgimento de vacinas.
O laboratório, que vai custar cerca de R$ 2 milhões, está sendo montado através de uma parceria com a Pontifícia Universidade Católica (PUC) de Curitiba-PR, Universidade do Estado do Amazonas (UEA) e Fundação de Amparo a Pesquisa do Amazonas (Fapeam), com recursos da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). Ele faz parte de um complexo maior financiado pelo governo federal, com contrapartida do Governo do Amazonas, que inclui o Laboratório de Nível de Biossegurança 3 (NB3), já em funcionamento na FMT/AM e um dos 13 projetados no Brasil para lidar com vírus de alto risco infeccioso para seres humanos, como o da dengue e da febre amarela.
Esta semana, a instituição recebeu a visita de um dos maiores especialistas em doenças infecciosas no Brasil. O professor Marcelo Mira, da PUC/PR, é quem está acompanhando a montagem do laboratório, orientando na compra de equipamentos e na implantação da tecnologia necessária. Farmacêutico bioquímico, Mira é doutor em genética molecular pela universidade de McGill, no Canadá, e um dos integrantes do grupo de cientistas que conseguiu mapear o gene humano responsável pela hanseníase.
O feito, que contou com a participação de cientistas norte-americanos, canadenses e de outros países, é considerado uma revolução nas pesquisas e um passo para a vacina contra a doença. Na pesquisa feita com a bactéria Mycobacterium Leprae, causadora da hanseníase, e através da análise dos genes humanos, os cientistas descobriram o fator N, fator genético que explica por que em grupos que convivem num mesmo ambiente com pessoas infectadas, alguns indivíduos adoecem e outros não.
"É a primeira vez no mundo que um estudo afirma por que as pessoas pegam a doença e qual o local exato do gene responsável pelo desenvolvimento dela", explica Marcelo Mira. Segundo ele, o estudo mostra que da mesma forma que o gene abre as portas da célula para permitir que a bactéria causadora da hanseníase entre, pode indicar uma forma de fechar essa porta, ou seja, uma vacina.
A médio prazo, a identificação do gene chamado parkina, o mesmo responsável pela doença de Parkinson, vai permitir o surgimento de teste de laboratório que pode dizer se a pessoa tem suscetibilidade para desenvolver a hanseníase, permitindo, com isso a busca de tratamento preventivo para pessoas que vivem em áreas de risco.
"Vai ser possível fazer um teste genético, usando a biologia molecular, para dizer que se você entrar em contato com a bactéria, pode ou não pegar hanseníase", complementa o diretor presidente da FMT/AM Sinésio Talhari, que prefere não fazer previsões em relação ao tempo em que isso deverá acontecer.
Segundo ele, o mesmo estudo feito por Mira e a equipe da universidade canadense será realizado nos laboratórios da FMT/AM para a identificação genética de outras doenças infecciosas, dentre elas a leishmaniose. Já sabe-se, por exemplo, que algumas pessoas submetidas ao tratamento não reagem da mesma forma.
"Vamos procurar saber quem pode ou não adoecer e, a partir daí desenvolver estudos para tratar as doenças preventivamente", explica o diretor da FMT/AM.
Investimento
Na construção do Laboratório de Biologia Molecular, cujas obras devem ficar prontas até o final de maio, estão sendo investidos cerca de R$ 1 milhão, já garantidos pela Finep, com contrapartida do Governo do Amazonas. Outro R$1,2 milhão deve ser adquirido a partir de um edital lançado pelo MCT para a compra de equipamentos. A previsão é de que até dezembro tudo esteja funcionando. O professor Marcelo Mira está colocando à disposição da FMT/AM toda a sua experiência em relação ao conhecimento da tecnologia de ponta que deverá ser implantada no laboratório. Um dos equipamentos que estão sendo adquiridos é uma super máquina capaz de processar a maior capacidade de genes de uma só vez.
De acordo com ele, os projetos para pesquisa genética são muito caros, daí a necessidade de se fazer o máximo de parcerias possíveis no País para o desenvolvimento deste tipo de estudo. "Paradoxalmente, pesquisas nas áreas de doenças tropicais interessam mais ao Brasil, mas são países como Estados Unidos e Canadá que estão à frente delas, porque eles possuem recursos para isso", observa o médico, lembrando que, enquanto os países desenvolvidos têm recursos para investir em tecnologia de ponta, faltam-lhes especialistas. "No Brasil, não temos a tecnologia, mas temos profissionais altamente capacitados. Se unirmos forças com outros estados vamos conseguir avançar", afirma o especialista.