Para tentar se esquivar da responsabilidade da alta da inflação, o presidente Jair Bolsonaro tem atribuído a culpa pelo aumento dos preços às medidas restritivas contra a Covid-19 e a governadores e prefeitos. Neste ano, o governo decidiu cortar impostos federais, como o PIS/Cofins sobre o diesel e o gás de cozinha, e aprovar no Congresso Nacional um projeto de lei que cria um teto de 17% para o ICMS (imposto estadual) sobre combustíveis, energia elétrica, comunicação e transporte coletivo.
Mesmo com as medidas, o chefe do Executivo aparece em segundo lugar nas pesquisas sobre intenção de voto, justamente atrás do seu principal oponente, o ex-presidente Lula. Em pesquisa divulgada nesta segunda-feira (15) pelo Instituto FSB Pesquisa, Bolsonaro aparece com 34% dos votos no primeiro turno, ante 45% de Lula. Na semana passada, o petista também tinha 41% das intenções de voto, e o atual mandatário, 34%, também segundo o FSB.
"Esses problemas apontados que mais afetam a rotina dos brasileiros (impostos, inflação, desigualdade e desemprego) estão todos conectados. É um sistema econômico, que ao funcionar de uma certa maneira, cria tanto inflação quanto desemprego, às vezes mais e às vezes menos, cria necessidade de aumentos não só de impostos, mas também do conjunto de contribuições - então a gente vai falar de tributos. E aumentando desemprego, inflação e tributos, aumenta a desigualdade", declara o economista e professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Elton Eustaquio Casagrande.
"Quanto à inflação, ela deve ceder até o final do ano - até porque a taxa de juros é absurda e exorbitante", continua ele. Em uma tentativa de controlar a inflação, o Comitê de Políticas Monetárias (Copom) do Banco Central aumentou mais uma vez a taxa básica de juros da economia. Desde a última reunião da entidade monetária, realizada no início deste mês, a Selic está em 13,75% ao ano.
Com a taxa básica de juros mais alta, outras taxas de juros também aumentam, o que torna empréstimos e financiamentos mais caros. Isso desestimula o consumo e, consequentemente, cai a demanda por produtos e serviços. Com uma queda na demanda, a oferta sobe, e os preços caem. Na ata da reunião, porém, o Copom reafirmou o seu plano de encerrar o ciclo de altas.
Correção da tabela do Imposto de Renda
Entre as promessas de campanha dos dois candidatos à presidência da República, está a correção da tabela do Imposto de Renda, que continua sem reajustes desde 2015. Nas últimas semanas, Jair Bolsonaro (PL) voltou a falar no assunto. Essa já era uma promessa dele em 2018, quando foi eleito. Mas a agenda nunca saiu do papel.
A defasagem da tabela leva pessoas com poder de compra cada vez menor para a base de contribuição – ou seja, há cada vez mais contribuintes obrigados a pagar imposto. Isso porque os salários sobem para acompanhar a inflação, mas a tabela do IR segue igual. Somente no governo Bolsonaro, entre janeiro de 2019 e junho de 2022, a defasagem somou 26,57%, segundo Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Sindifisco Nacional).
"Quem ganha um salário mínimo (R$ 1.212) está quase pagando o Imposto de Renda. Se corrigir a tabela de uma maneira radical, as pessoas vão ganhar mais, vão perder menos com a inflação e vão poder consumir mais, o que vai reativar a economia muito rapidamente. Então, eu acho que a classe empresarial hoje, preocupada com o desemprego, preocupada com a desigualdade, devia fazer uma pressão para, por exemplo, a correção da tabela do Imposto de Renda e de outros aspectos também práticos para aumentar o poder de compra da população", avalia o economista.
"Essa não devia ser uma medida de promessa política. Ela já é há bastante tempo uma medida necessária para o bom andamento econômico. Porque a não correção penaliza quem tem desconto na fonte e tem rendimento menor. Essa questão de promessa tanto de um quanto de outro candidato não devia estar sendo colocada no Brasil em termos de preocupação social. Isso já deveria estar resolvido, porque medidas para isso a classe política tem", continua.
Já Lula disse, inclusive nesta terça, que uma de suas primeiras ações, se eleito em outubro, será corrigir a tabela do Imposto de Renda. A declaração foi dada a trabalhadores do lado de fora de uma fábrica em São Bernardo do Campo (SP).
"Eu vejo que a economia brasileira é uma economia que falta recursos, ou seja, tem limitação para ser uma política mais efetiva, principalmente por conta do 'alto custo Brasil'. Os gastos públicos são enormes, e não sobra recursos para infraestrutura e tudo que precisa ser feito no nosso país. Então, nós temos aí: os gastos públicos e o teto de gastos, que foi aprovado no governo Temer e limita muito a atuação do Executivo. E também a reforma tributária que não sai e seria fundamental para o país", expõe o representante comercial Edilberto Malta, que diz que votará em Bolsonaro contra Lula em um eventual segundo turno.
Auxílio Brasil
Para aumentar sua popularidade entre os mais pobres, base eleitoral do ex-presidente Lula, o presidente Jair Bolsonaro articulou a aprovação da chamada "PEC (Proposta de Emenda à Constituição) Eleitoral" ou "PEC de bondades", que instituiu estado de emergência e permitiu a criação ou ampliação de uma série de benefícios em ano de eleições. O texto foi promulgado pelo Congresso no final de julho.
A PEC aumentou o valor do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600, dobrou o valor do vale-gás e criou um auxílio de R$ 1 mil para caminhoneiros e para taxistas. O Auxílio Brasil, substituto do Bolsa Família, criado no governo do PT, é a principal aposta de Bolsonaro para a corrida eleitoral.
Como as medidas proporcionadas pela PEC valem até o final deste ano, elas vêm sendo chamadas de "eleitoreiras" pela oposição. "Realmente, elas foram tomadas na reta final da eleição. Eu acho que o eleitor tem sim razões para desconfiar, porque o país vinha em uma crise econômica muito forte, e o presidente não teve muitas políticas para os mais pobres. Ai, de repente, na reta final da eleição, tem vários benefícios. Então isso pode muito bem soar para o eleitorado como algo eleitoreiro", diz Alberto Carlos Almeida.
Como os benefícios começam a ser pagos neste mês, ainda é cedo para avaliar o quanto devem influenciar nas pesquisas de intenção de voto nos próximos meses. "Alguma mudança pode trazer sim. Mas não acho que altera o cenário geral, que é de favoritismo do Lula", diz o cientista político.
Ainda que o programa de transferência de renda tenha sido criado no governo Bolsonaro, Lula ainda tem vantagem sobre os eleitores beneficiários do Auxílio Brasil. Uma nova rodada de pesquisa do instituto Ipec, divulgada na noite de segunda (15), revelou que o petista tem 52% das intenções de voto entre aqueles que recebem o auxílio ou moram com alguém que recebe. Bolsonaro tem 27%.
Os dois candidatos parecem dispostos a disputar por essa parcela da população. Ambos têm prometido tornar o benefício de R$ 600 permanente no ano que vem.